Veículo: Valor Econômico
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Data: 06/08/2024

Editoria: Sem categoria
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Análise: Copom coloca possibilidade de alta de juro, mas evita decisão antes da hora

O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central colocou na mesa a possibilidade de uma alta de juros na sua próxima reunião, em setembro, mas ao mesmo tempo evitou tomar uma decisão antes da hora.
A ata da reunião da semana passada do colegiado, divulgada nesta manhã, diz que a decisão em setembro vai depender da evolução da situação econômica até lá, “sem se comprometer com estratégias futuras”.
Essa abordagem condicional serve bem ao comitê no cenário inflacionário desfavorável que viu na reunião da quarta-feira da semana passada e, mais do que isso, mostra-se adequada para lidar com a situação nova que surgiu a partir do dia seguinte, quando se acirraram os temores de uma recessão nos Estados Unidos.
É improvável que o Copom tenha atualizado a sua ata para se adequar aos acontecimentos mais recentes. A governança da elaboração desse documento faz com que o comitê se restrinja ao relato do que foi discutido na reunião do Copom. Se tivesse algo diferente, deveria ter sido dito de forma explicita no texto da ata.
Assim, é importante se atentar para como o Copom via, na sua reunião, a situação nos Estados Unidos para, a partir deste marco inicial, seguir o fio da meada e procurar antecipar como as novidades podem afetar a decisão do Copom em setembro. “Vislumbra-se um cenário de redução gradual da inflação e da atividade e um início cauteloso da flexibilização monetária”, diz a ata, referindo-se aos Estados Unidos.
Ou seja: uma queda mais forte da economia dos Estados Unidos não estava nos cálculos do Banco Central, tampouco um ciclo mais agressivo de distensão monetária pelo Federal Reserve (Fed, o BC americano).
Também é essencial compreender como o Copom vai digerir as novidades: a baixa dos juros nos Estados Unidos não se transmite de forma mecânica para os juros no Brasil, nem a baixa do dólar. Vai depender de como isso afeta a inflação, que depende também de outras variáveis, como o grau de aquecimento da economia e a evolução da política fiscal.
No geral, a ata é mais conservadora do que supunha a leitura inicial do comunicado feita pelos analistas econômicos, na semana passada. São muito claras as hipóteses em avaliação – manutenção ou alta de juros para cima dos atuais 10,5% ao ano –, a depender da situação que o colegiado encontrar na sua reunião de setembro.
O mercado fez uma interpretação equivocada da opinião do Copom sobre a sua projeção de inflação. Achou que o percentual de 3,2% para o período de 12 meses até março de 2026 estava muito próximo da meta, a ponto de não se distinguir dela. A ata do Copom é direta em dizer que o percentual “está acima da meta de inflação, de 3%”. Ou seja, o juro atual de 10,5% ao ano já não parece suficiente.
O mercado também minimizou os sinais de preocupação dados pelo Copom sobre o seu balanço de riscos para a inflação. Todos os membros reconheceram que há mais itens listados que apontam o risco de a inflação superar a meta. “Vários membros” enfatizaram a assimetria do balanço de riscos para a inflação, ou seja, apontaram que os fatores altistas preponderam sobre os baixistas.
Não tivesse acontecido nada de novo desde quinta-feira, portanto, a mudança de precificação de mercado – que assumiu um Copom mais “dovish”, ou pouco mens inclinado a aperto de juros – teria se mostrado precipitada. A ata do Copom não parece fazer distinção sobre as chances de manutenção de juros e de aperto adicional.
No meio desat mensagem mais conservadora, há alguns senões que dizem respeito à coerência entre a ata e a decisão de manter os juros na semana passada. Se o Copom acha que a inflação projetada está acima da meta, por que já não subiu os juros? Havia razões para, pelo menos, um placar dividido, considerando que “vários membros” veem com uma dose maior de ceticismo essa projeção, já que dizem que as chances de a inflação ficar acima dela são maiores do que as de ficar abaixo dela.
A manutenção dos juros, empurrando a decisão sobre uma alta ou não para setembro, pode ser o reflexo de um comitê que procura consensos nas suas decisões, depois das cicatrizes deixadas por sua decisão dividida em maio. Mas, no fim, houve um acerto: andar mais devagar dá mais tempo para o Copom analisar com mais calma e mais informações uma conjuntura que se mostrou mais incerta.