A disparidade de impostos entre Brasil e países vizinhos, como o Paraguai, estimula o mercado ilegal de produtos, causando um prejuízo bilionário à indústria nacional. Segundo especialistas, o alto custo tributário reduz a competitividade das mercadorias brasileiras, especialmente aquelas que já possuem taxação diferenciada no país. Torna, ainda, o contrabando atrativo, sustentando o fluxo criminoso dos mais diversos produtos.
De acordo com levantamento do FNCP (Fórum Nacional Contra a Pirataria e Ilegalidade), somente em 2023, o prejuízo causado pelo mercado ilegal no Brasil foi de R$ 441,2 bilhões, considerando a soma de perdas econômicas e a sonegação de impostos em 15 setores da indústria brasileira. O montante quadruplicou em 9 anos –em 2014, o valor era de R$ 100 bilhões, conforme a entidade.
A possibilidade de que a reforma tributária, em fase de regulamentação pelo Congresso, resulte em aumento de impostos é uma preocupação da indústria. No cerne da discussão está o IS (Imposto Seletivo), novo tributo que será aplicado a bens e serviços considerados prejudiciais à saúde e ao meio ambiente.
Previsto no PLP (projeto de lei complementar) 68/2024, enviado em abril pelo governo federal ao Congresso, o IS incidirá sobre 6 categorias. É o caso de cigarros, bebidas alcoólicas e com alto teor de açúcar, veículos, embarcações e aviões e bens minerais extraídos.
A proposta de onerar esses produtos parte de uma ideia de que o aumento da tributação servirá para inibir o consumo. Segundo os especialistas, o raciocínio exige uma reflexão cuidadosa, considerando, especialmente, a realidade brasileira e alguns elementos empíricos.
Eles explicam que qualquer acréscimo à carga tributária terá efeito imediato para o crescimento do mercado ilícito, já que refletirá diretamente em aumento do preço dos produtos nacionais em relação aos do contrabando.
“Todo aumento de imposto é vantajoso para o produto ilegal, porque a margem de preço fica cada vez mais favorável para o contrabandeado. Um produto que não paga imposto, versus o outro que paga, evidentemente a vantagem competitiva dele vai ser enorme, porque a mercadoria ilícita terá uma diferença de preço ainda mais favorável”, explicou o presidente do FNCP, Edson Vismona.
Para o advogado e procurador especial tributário do Conselho Federal da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Luiz Gustavo Bichara, o IS tornará os preços de produtos, como cigarro e bebidas alcoólicas, mais altos. Ele explica que o objetivo do governo é que a arrecadação do novo tributo equipare-se à do atual IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), estimada em R$ 50 bilhões.
“O IPI atualmente incide sobre uma infinidade de produtos, enquanto o Imposto Seletivo incidirá sobre um número limitado de produtos. É possível concluir que esses produtos serão ainda mais onerados pelo IS do que são hoje pelo IPI. Em outras palavras, teremos indiscutível aumento de carga tributária“, disse o advogado.
Além disso, na avaliação de Bichara, como a alíquota do Imposto Seletivo será estabelecida por lei ordinária –votada em quórum de maioria simples–, existe o risco de o imposto ser utilizado como instrumento para aumento de arrecadação por parte do governo. Para Vismona, a reforma desenha um cenário favorável ao aumento do desequilíbrio fiscal, que daria ainda mais vantagem ao mercado ilegal. “As condições para o crescimento do ilegal são muito presentes, muito fortes. Com a reforma tributária, a preocupação é ainda maior, porque nós temos uma situação hoje de certa forma estável no que tange aos impostos incidentes sobre os produtos brasileiros“, explicou. Leia sobre os prejuízos causados pelo mercado ilegal ao país no infográfico.