Veículo: Valor Econômico - Online
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Data: 24/05/2024

Editoria: Sem categoria
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Mercado doméstico sustenta resultado das empresas no 1º tri, mesmo com incertezas macroeconômicas

As empresas que atuam no setor doméstico foram o destaque positivo de uma temporada de divulgação de balanços do primeiro trimestre que orbitou sobre as incertezas macroeconômicas tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos. Analistas ouvidos pelo Valor, no entanto, continuam otimistas que a dinâmica favorável deve perdurar ao longo dos próximos meses.

O levantamento do Valor Data, que leva em consideração 403 empresas não financeiras e exclui Petrobras e Vale – que pela sua grandeza distorcem o levantamento – e companhias que passam por recuperação judicial, mostra que o lucro líquido do primeiro trimestre caiu 0,7% em um ano, a R$ 44,6 bilhões, enquanto a receita líquida subiu 2,6% no mesmo período, a R$ 851,3 bilhões. O lucro operacional (Ebit) avançou 4,7%, a R$ 109,1 bilhões.

A queda na última linha dos balanços se explica pelo resultado financeiro de algumas companhias com forte atuação no mercado externo, como Suzano e Braskem, que sofreram com efeito cambial negativo em suas dívidas.

“Quando nós olhamos apenas o resultado das empresas do setor doméstico, foi uma temporada de resultados boa, com crescimento relevante de lucro e Ebitda na comparação anual”, diz Ricardo Peretti, estrategista de ações da Santander Corretora. “Mas os números das exportadoras de commodities puxam o desempenho para baixo e deixa o todo como neutro, não mudou a bolsa de patamar.”

No universo de cobertura do Santander, cerca de 150 companhias, o lucro líquido das empresas domésticas subiu 21,5% no ano, enquanto as exportadoras de commodities tiveram queda de 37,3%. “Tivemos uma recuperação clara nos indicadores durante o primeiro trimestre que ajudaram as empresas domésticas, enquanto dólar mais fraco e preços baixos de commodities prejudicaram exportadoras”, explica Peretti.

Entre os vários setores da economia doméstica, os analistas destacam saúde, consumo e alimentos como surpresas positivas. “Tivemos resultados nesses setores que superaram bastante as expectativas dos analistas para o trimestre”, afirma Daniel Gewehr, chefe de estratégia para Brasil do Itaú BBA. Ele pondera que as empresas tiveram bons resultados operacionais e se beneficiaram da queda nos juros.

Hapvida e Rede D’Or surpreenderam o mercado ao apresentar tendências operacionais melhores do que o esperado, com queda na sinistralidade, e foram os destaques no setor de saúde. Frigoríficos, em especial operadoras de frangos e suínos, tiveram tendência positiva de custos e viram seus números surpreenderem. Entre consumo, destaque para operadores de supermercados e varejistas de alta renda na temporada.

“Essa é uma das teses que defendemos para continuar acreditando no crescimento do lucro das empresas, já tem uma queda de juros acumulada de 300 pontos-base nos últimos 12 meses e mesmo que o Banco Central diminua o ritmo agora, o impacto nas despesas financeiras das empresas continuará significativo”, diz Gewehr. Ele acredita que a tendência é de continuidade na revisão positiva no consenso do lucro das empresas.

As companhias exportadoras de commodities apresentaram um cenário diferente. O dólar mais fraco, caindo 4,62%, na média do trimestre, em um ano, além de preços mais baixos das commodities e problemas operacionais acabaram prejudicando os resultados, em especial de Petrobras e Vale, que estão entre os maiores pesos da bolsa brasileira.

Jennie Li, estrategista de ações da XP, diz que a Petrobras teve uma queda maior do que o esperado na produção que afetou seu desempenho financeiro. Já a Vale viu a queda nos preços do minério de ferro e a valorização do real afetarem desproporcionalmente seus números. Siderúrgicas, com exceção de Gerdau, ainda sofreram com preços baixos por conta do fluxo de aço chinês.

Os números das exportadoras de commodities puxam para baixo”
— Ricardo Peretti

“Vemos que o dólar voltou a se fortalecer, deu aquela subida forte em abril e parece ter se acomodado em um patamar mais alto do que do primeiro trimestre em maio, o que vai ajudar as exportadoras”, afirma. Os preços das commodities, entretanto, continuam sob a égide da economia da China e das tensões geopolíticas.

A temporada de divulgação de resultados do primeiro trimestre aconteceu em meio a três eventos que acabaram por influenciar o discurso das empresas: o aumento dos riscos fiscais aqui no Brasil, a aceleração da inflação nos Estados Unidos e o evento climático extremo no Rio Grande do Sul. Os analistas acreditam que o susto para as empresas acabará sendo maior do que efeitos práticos em seus resultados.

Uma análise do Itaú BBA, utilizando inteligência artificial generativa e que avaliou o tom e sentimento de 155 teleconferências, mostrou que a média de humor ficou em 7,46, em uma escala de 0, mau humor, a 10, bom humor. As notas variaram de 4 a 9, destaca Gewehr, com siderurgia e agro os únicos setores com notas médias abaixo de 7. “O tom do diretor da empresa está mais otimista do que o do investidor”, afirma.

Em estudo semelhante, o Santander destacou que a incidência das palavras “recuperação”, “incerteza” e “desafiador” caiu nas teleconferências do primeiro trimestre. Do lado contrário, “confiança”, “crescimento” e “consumo” foram mais citadas, diz Peretti. “Acho que a temporada mostrou que o pior do ciclo de lucros das empresas domésticas passou”, afirmou

“Tivemos uma acomodação do cenário macro agora em maio, vimos alguns sinais um pouco mais positivos, mas o mercado continua bastante pressionado”, afirma Jennie Li. Ela vê um descasamento entre o desempenho operacional das empresas e das ações, o que explica um pouco o tom otimista das companhias em meio às dúvidas sobre o macro. “Até termos um direcionamento dos juros, ações de empresas de qualidade continuarão sofrendo.”