Veículo: Valor Econômico
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Data: 10/09/2025

Editoria: Amazon, L-Founders, Mercado Livre
Assuntos:

Análise: Por que Mercado Livre não deve se preocupar tanto com o acordo Amazon/Rappi

Por 

Adriana Mattos

, Valor — São Paulo

09/09/2025 14h38  Atualizado há 2 horas

A negociação fechada entre a empresa de entregas colombiana Rappi e a gigante americana Amazon, que dá o direito para a plataforma de marketplace se tornar sócia da Rappi, é um dos primeiros grandes movimentos de reação à concorrência na América Latina pela líder global on-line, mas com impactos limitados sobre Mercado Livre.

A parceria se dará por meio de um investimento da Amazon de US$ 25 milhões em notas conversíveis. O Valor apurou que isso pode levar a uma troca por participação acionária. Foi utilizado um instrumento financeiro que confere o direito da Amazon de comprar ações da empresa num determinado período de tempo, apurou a reportagem.

Inicialmente, a informação do acordo foi publicada pela “Bloomberg”, e a Amazon ainda não comentou o tema ou confirmou se já executou esse direito, que estaria atrelado a determinados resultados, diz a agência.

Segundo a “Bloomberg”, o acordo concede à Amazon o direito de adquirir até 12% da Rappi por meio de emissão de bônus.

Trata-se de um valor irrisório para a Amazon, e também nada relevante para a Rappi, mas que pode ser uma porta de entrada para acordos mais estratégicos na área de entregas na “última milha”, algo que nos EUA funciona incrivelmente bem, mas, no Brasil, maior mercado de consumo da América Latina, a Amazon ainda é menos competitiva que Mercado Livre.

Mesmo que isso evolua para novos acordos, a estrutura da Rappi ainda é menor que a de outros grupos, como a líder iFood, e além disso, a chegada e expansão das plataformas chinesas na América Latina, como a Keeta, mostra que a vida da Rappi não será fácil.

Na prática, a Amazon pode ter demorado para se mexer por aqui, com apoio de um parceiro que já deve ser desafiado por rivais estrangeiros altamente capitalizados. A Keeta é o braço internacional de delivery da Meituan, e está entrando no Brasil, possivelmente, em novembro neste ano.

Na visão do Santander, em relatório da equipe de análise, dada a amplitude do ecossistema de Mercado Livre (formados por diferentes serviços, como publicidade, envios e crédito), e a economia ainda difícil para empresas de “última milha” como a Rappi, haverá impactos limitados de curto prazo para o Mercado Livre.

A empresa líder do comércio on-line no país tem uma logística de armazenamento, entrega e de serviços financeiros mais competitiva que a da Amazon no Brasil. Para quem achava, no passado, até com certa dose de exagero, que seria a Amazon o grande concorrente do comércio brasileiro, após sua entrada, há 13 anos, foi o Mercado Livre que ocupou claramente esse papel.

Para a equipe do banco Santander, essa questão concorrencial pode se tornar um novo tópico a ser observado, especialmente a partir de 2026 — provavelmente com estruturas mais maduras de concorrentes e da própria Amazon.

Efeito Shopee na ‘cola’

Ainda é preciso por nessa conta o “fator Shopee”, empresa do grupo chinês Sea Group.

A plataforma asiática cresce aceleradamente no país desde 2020, inclusive incomodando Mercado Livre. A depender da pesquisa a ser observada, Shopee já teria superado a Amazon no Brasil em termos de volume movimentado (GMV, da sigla em inglês).

Um terceiro lugar no ranking geral do mais importante mercado da América Latina para a Amazon não é algo a se orgulhar.

Para uma fonte ouvida hoje pelo Valor, a par da operação dos americanos, a Amazon ampliou foco de atuação em mercados da África, e nesse movimento, a América Latina acabou ficando em segundo plano nos últimos anos em termos de investimentos mais estratégicos regionais.

Para a equipe do Santander, a promessa de entrega “Turbo” da Rappi — em menos de dez minutos — e seu crescente conjunto de serviços financeiros poderiam complementar o braço da da Amazon na região.

No México, a Amazon já oferece uma oferta de frete grátis por um ano na Rappi para seus membros Prime.

“Isso [acordo Amazon/Rappi] nos parece um passo muito inicial na fase pós-atendimento, onde a concorrência nos marketplaces online muda de escala logística para densidade de entrega ultrarrápida, com impacto limitado no curto prazo para a Mercado Livre, mas o risco de médio prazo vale ser monitorado”, diz o relatório do banco.

Compras estratégicas voltam

Paralelo a esse movimento, o Mercado Livre ainda parece estar um passo à frente dos americanos no Brasil, já tentando avançar no mercado de farmácias e medicamentos por aqui, algo que não parece estar no foco de investimentos da Amazon no Brasil agora.

A compra de uma farmácia em São Paulo pelo Mercado Livre, a Cuidamos Farma, controlada pela startup Memed, abre uma janela para um eventual acordo da Memed e Mercado Livre.

Mesmo que a empresa se limite a confirmar apenas a compra da farmácia, localizada em São Paulo, é sabido que Mercado Livre raramente faz aquisições, a não ser que a compra seja totalmente alinhada com um plano de crescimento em parceria que lhe pouparia anos no plano de negócios.

A Memed se tornou a principal plataforma digital de receituário digital no país, com uma base de dados de clientes gigantesca — e um futuro acordo maior com a empresa economizaria um bom tempo de investimentos no setor. É mais um sinal de que as peças desse segmento ainda estão se mexendo, e a disputa por mercado pode abrir uma nova frente de acordos táticos e/ou estratégicos de longo prazo.

 — Foto: Vinicius Stasolla/Divulgação
— Foto: Vinicius Stasolla/Divulgação