Os furtos e roubos de celulares no entorno de estações de metrô em São Paulo cresceram mais do que no resto da capital, mostra levantamento exclusivo do Estadão com bases em dados da Secretaria da Segurança Pública (SSP).
No raio de até 250 metros das estações, a alta foi de 15,5% no 1º semestre, ante o mesmo período de 2024. Na cidade como um todo, subiu 9,6%.
Ladrões miram essas áreas por causa do grande fluxo de pessoas e dos smartphones, por onde multiplicam seus lucros com transferências bancárias. A região da Estação República, conexão das Linhas 4-Amarela e 3-Vermelha, é a que registrou mais crimes.
Em nota, a SSP destaca as operações da Polícia Civil não só para recuperar celulares roubados, mas reprimir o comércio ilegal e punir receptadores.
O Metrô diz ter mais de 900 agentes em rondas permanentes, incluindo em acessos de estações, terminais de ônibus anexos, plataformas e vagões. A Motiva, concessionária das linhas 4 e 5, afirma ter seguranças e monitoramento em tempo real (leia mais abaixo).
O mapa interativo abaixo mostra os arredores de 85 estações.
Retrato da criminalidade
Na cidade, foram 58.893 registros de furtos e roubos de celular de janeiro a junho. Do total, 7,1 mil foram em até 250 metros das estações do metrô.
Segundo o Metrô, a atuação da estatal se estende até a faixa branca pintada na entrada de cada estação, que delimita a circunscrição de sua responsabilidade. Depois disso, o monitoramento e o policiamento das ruas ficam a cargo da SSP.
A estatal também recorre a policiais militares em regime de trabalho extraordinário, o convênio Dejem, para reforçar a estrutura de segurança.
O entorno da estação da República, no centro, lidera com 569 ocorrências: 420 furtos e 149 roubos. A estação está junto à praça de mesmo nome, considerada um dos epicentros da atuação gangues de bicicleta.
Os arredores da Consolação, da Linha 2-Verde na Avenida Paulista, vêm em seguida, com 415 delitos contabilizados no semestre – 90% são furtos (371). Além da alta circulação no horário comercial em dias úteis, a Paulista atrai frequentadores à noite por causa do grande número de bares, lojas e restaurantes. Aos domingos, a via é fechada para veículos e aberta para atividades de lazer, tipo de aglomeração que também favorece furtos.
Também da Linha 4-Amarela, importante linha que conecta a região oeste ao centro da capital, destacam-se outras estações, como Butantã (175 crimes), Faria Lima (101) e Higienópolis-Mackenzie (100).
Via que atravessa bairros nobres, como Jardim Europa, Pinheiros, Itaim Bibi e Vila Olímpia, a Faria Lima tem visto a alta de falsos motoboys armados, como mostrou o Estadão. A região é visada pelos bandidos por causa da movimentação de representantes de grandes empresas, principalmente do setor financeiro e de tecnologia.
Pinheiros também tem visto nos últimos meses uma série de crimes violentos, incluindo latrocínios e arrastões em restaurantes.
Nas estações do centro expandido, o padrão criminal perto das estações também é influenciado por grandes eventos, como o carnaval de rua, a Virada Cultural, a Parada do Orgulho LGBT+, entre outros.
Aglomerações dos horários de pico também facilitam que bandidos se escondam ou fujam. Foi o que aconteceu com o cuidador de idosos Adélio Gomes, de 38 anos, assaltado nas imediações da Estação Tatuapé, da Linha 3-Vermelha, na zona leste, no último dia 29.
“Do nada, a mão veio para cima do meu telefone. Quando olhei para o lado, já não tinha mais como correr”, conta. O crime foi por volta das 6h30 da manhã, quando as ruas próximas ficam cheias. “É uma ‘muvuca’ nesse horário.”
O levantamento do Estadão mostra ainda que a proporção de roubos (se há grave ameaça ou violência) cresce em áreas mais distantes do centro. As estações Vila União – da Linha 15-Prata, do monotrilho, na zona leste – e a Campo Limpo – da Linha 5-Lilás, na sul – têm os menores números absolutos de crimes (aproximadamente 30). As duas têm, no entanto, a maior proporção de roubos em relação ao total.
Áreas de menos comércio e fluxo de pessoas, fora do centro expandido e com menor cobertura de câmeras de vigilância, estão mais suscetíveis a abordagens truculentas e com intimidação, incluindo com uso de armas de fogo.
Celulares na mira
Celulares são, já há alguns anos, os principais alvos de criminosos em São Paulo – muitos deles em abordagens de bicicleta ou disfarçados de motoboys. Os telefones se tornaram “agências bancárias móveis” por causa da popularização do Pix e dos aplicativos bancários.
“Diferentemente do roubo de carro, em que o objetivo eram as peças para venda, o celular propicia um mundo enorme de acesso à conta bancária, com aplicativos de compra e acesso a cartões de crédito”
Carolina Ricardo
diretora-executiva do Instituto Sou da Paz
“Isso torna o celular um bem muito mais valioso para o crime, que se organiza e se profissionaliza”, acrescenta Carolina. Em alguns casos, os bandidos chegam a exigir que a vítima informe a senha de desbloqueio dos aparelhos. Também há células de receptação de telefones roubados, onde é feito rapidamente o desbloqueio.
Um dos reflexos desse cenário é a alta de golpes, muitos deles cometidos a partir de aparelhos levados pelos ladrões. No ano passado, foram cerca de 2,17 milhões de casos no País, conforme o Anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Ainda segundo o levantamento, um a cada cinco roubos ou furtos de celular acontece na cidade de São Paulo. Trata-se da terceira capital, em todo o País, com a maior taxa dessa modalidade de crime para cada 100 mil habitantes, atrás apenas de São Luís e Belém.
Como a reportagem foi feita
Esta reportagem têm como base o registro dos crimes reportados ao Sistema de Registro Digital de Ocorrência (RDO), plataforma utilizada pela SSP para armazenar informações de boletins de ocorrência. Os dados seguem a mesma metodologia utilizada pelo Radar da Criminalidade, ferramenta exclusiva do Estadão, e considera apenas ocorrências com endereço completo (geolocalizadas). O número de ocorrências não corresponde ao número de celulares subtraídos, uma vez que em um mesmo caso mais de uma unidade pode ser levada.
O raio de 250m utilizou como referência a localização das estações paulistanas listadas no GeoSampa, sistema de informações geográficas da Prefeitura de São Paulo, que fornece dados geoespaciais e cartográficos da cidade. Foram consideradas as estações mais antigas em casos de terminais que compartilham mais de uma linha. O cuidado foi tomado para evitar contagem duplicada de ocorrências.
É importante lembrar que o RDO não comporta dados detalhados sobre horários dos roubos e furtos. Por isso, este material não se limita a roubos e furtos ocorridos no horário de funcionamento do Metrô (4h40 a pouco depois da meia-noite – o horário muda conforme a estação).