Veículo: Valor Econômico
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Data: 21/02/2025

Editoria: L-Founders
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Mercado de luxo cresce no Brasil, enquanto consumo global desacelera

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Imortalizada no filme ‘Bonequinha de luxo’, a joalheria Tiffany vai ganhar novo endereço bem longe de Nova York, onde foi fundada em 1837. A nova loja será aberta no Flamboyant Shopping, em Goiânia, coração do Centro-Oeste que entrou para a rota do mercado de luxo nos últimos anos graças aos consumidores de alta renda ligados ao agronegócio e à indústria musical. Trata-se da quinta capital brasileira a receber uma unidade da marca, depois de São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Curitiba, o que mostra que a companhia continua apostando no país.

Marcas como Tiffany e Comme Des Garçons, butique japonesa que vai inaugurar loja no Iguatemi (SP) neste ano, estão de olho no mercado brasileiro, que hoje conta com 1,3 milhão de pessoas de alto poder aquisitivo, podendo chegar a 1,5 milhão até 2030.

“A expansão do mercado de luxo no Brasil tem se mantido nos últimos anos. Em 2023, alcançou um crescimento de 30%. No ano passado, a média foi de 11,7%. E nossa expectativa média para este ano é de 15%”, diz Carlos Ferreirinha, sócio-fundador da MCF Consultoria que faz, a cada ano, uma sondagem do mercado de luxo em parceria com a Associação Brasileira das Marcas e Empresas de Luxo (Abrael). A associação conta com 70 filiados, de hotéis e agências de viagens a shoppings, de beleza a carros, com marcas com Chanel, Cartier, NKStore, Jaguar, Matueté, entre outras.

Várias categorias conseguiram expandir as vendas no ano passado. Segundo Ferreirinha, “joias tiveram um primeiro semestre muito bom em 2024 e o relógios performaram forte no segundo.” Outra área de destaque, diz, foi o imobiliário. “Do crescimento de 40% do setor, 13% foram de lançamentos de alto padrão. Estamos num momento de geração de riqueza elevadíssimo no Brasil”.

A presidente do grupo Flamboyant, Emmanuele Louza, conta que os clientes se sentem “donos” do shopping em Goiânia. “Eles me mandam mensagens pedindo para inaugurar serviços e trazer lojas que conheceram na Europa”, afirma. O resultado disso é que o local vai passar por uma expansão, com três novos pisos, para abrigar as grifes que devem desembarcar em Goiânia nos próximos anos. A expectativa é que os 20 mil metros quadrados de área bruta locável sejam inaugurados em 2027. “As marcas querem estar no Brasil, ainda que sejamos um mercado pequeno. O motivo é que a operação local dá resultado”, acrescenta.

Uma das principais barreiras para um crescimento mais forte seria a variação cambial. Como muitas marcas internacionais têm de reportar seus resultados em dólar ou euro, “as defasagens criam resultados muito complicados”, diz o consultor. Pelo levantamento da Abrael/MCF, as grifes operaram no ano passado com preços 20% superiores aos do varejo nos Estados Unidos e 25% a mais no da Europa. Outro fator que pode desestimular compras, diz ele, é “um mundo muito nervoso, com muita animosidade, que faz com que as pessoas fiquem inseguras e posterguem investir em bens de luxo.”

O presidente da JHSF, Augusto Martins, observa que o Brasil não é um destino de luxo para estrangeiros, como outras capitais do mundo, como Paris e Londres. “Temos poucos turistas com foco em consumo de alta renda”, diz. Isso é um empecilho para um crescimento mais robusto do mercado como um todo.

Por outro lado, há brasileiros de alta renda mais dispostos a gastar com experiências que valorizam o bem-estar. “Tudo que fale com experiências tem crescido no ritmo muito mais significativo, como viagens, hotelaria, gastronomia e serviços exclusivos”, afirma Martins.

Nesse sentido, os shopping centers identificaram que era preciso ir além de ter corredores cheios de grifes de peso. Era necessário oferecer, por exemplo, alta gastronomia, e experiências exclusivas, como promover um evento no museu de Inhotim, em Brumadinho (MG). “Acreditamos na simbiose de produto e experiência”, afirma o vice-presidente comercial do Grupo Iguatemi, Ciro Neto. Essa estratégia tem atraído até mesmo marcas de outros segmentos, como a corretora XP que patrocinou a parada de Natal do Iguatemi.

A expansão do setor de luxo no país no ano passado ocorreu enquanto o mercado global dava sinais de arrefecimento. Em 2024, os gastos globais com produtos e serviços de luxo caíram 3%, para € 1,48 trilhão, de acordo com levantamento da Bain e pela associação italiana Fondazione Altagamma. A pesquisa engloba nove segmentos como automóveis, bens pessoais e hotelaria.

“Lá fora, as pessoas estão gastando menos em produtos e mais em experiências, tanto que o turismo de luxo avançou cerca de 9% no ano passado. Há também uma tendência de investir em bem-estar”, diz o sócio da Bain, Gabriele Zucarelli.

Já para 2025, a estimativa para o mercado global é de estabilidade. A exceção é a América Latina, com destaque para Brasil e México, que devem continuar crescendo. Isso acontece porque os dois países são pequenos em relação aos mercados dos Estados Unidos e China, logo, a base de comparação é mais baixa. Mas não apenas.

Essas regiões, somadas à Índia, Sudeste Asiático e África, devem contribuir com 50 milhões de novos consumidores de luxo até 2030. É o mesmo número de compradores que ‘evaporaram’ nos últimos dois anos, à medida que os gastos com bens pessoais de luxo recuaram. Somente em 2024, a queda foi de cerca de 2%, para € 363 bilhões. Não por um acaso, estima-se que apenas um terço das empresas de luxo registrou crescimento no ano passado, em comparação a 95% entre 2021 e 2022 e 65% em 2023.

O relatório da Bain & Co destaca o desempenho positivo do Brasil na América Latina. “O fato de o Brasil superar o México como a maior economia na região refletiu claramente nos resultados das marcas de luxo por aqui”, diz Zucarelli.