Veículo: Estadão
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Data: 20/02/2025

Editoria: Shopping Pátio Higienópolis
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O que levou o St Marche e outras varejistas ao endividamento? Entenda motivos

A rede de supermercados St Marche entrou com um pedido de tutela judicial para renegociar dívidas de R$ 639 milhões, um processo que antecede o pedido de recuperação judicial. Segundo analistas, o problema não é exclusivo ao St Marche, mas parte de uma tendência que afeta o setor varejista e tem razões multifatoriais.

Empresas de varejo do segmento alimentar, como St Marche, CarrefourGrupo Pão de Açúcar e Dia, tomaram crédito em 2020, quando a taxa Selic estava em 2% ao ano. Em muitos casos, têm juros do CDI somados a uma taxa adicional, totalizando, por exemplo, uma dívida com juro de 7% ao ano (2% dos juros e 5% de taxa adicional). Porém, o salto que levou a Selic de 2% em janeiro de 2021 para 13,75% em agosto de 2022 tornou as dívidas muito mais caras.

Com isso, somada à redução do poder de compra dos consumidores devido ao aumento da inflação, ao juro elevado que inibe o consumo e às margens historicamente baixas no setor varejistas, que ficam entre 2% e 6%, as dívidas estão se tornando impagáveis.

O sócio da consultoria RGF, Rodrigo Gallegos, afirma que o setor de varejo alimentar também vinha esperando resultados mais positivos, o que não se concretizou nos últimos anos. “Temos visto que o setor passa por uma redução do consumo por causa da inflação. Os clientes acabaram consumindo um pouco menos e as empresas estavam prevendo um consumo um pouco maior, o que acaba afetando o resultado direto esperado”, diz.

Além disso, o caso do rombo bilionário na Americanas, reportado no começo de 2023, tornou o crédito para esse setor mais conservador, dado o risco que os empréstimos a essas empresas podem representar aos bancos.

St Marche está entre as empresas de varejo que passam por dificuldades financeiras
St Marche está entre as empresas de varejo que passam por dificuldades financeiras Foto: Massimo Falluti

O cenário que afeta o St Marche é, portanto, similar ao que levou o Dia a entrar com pedido de recuperação judicial em março de 2024, com dívida de R$ 1 bilhão. Após isso, o grupo espanhol vendeu o seu capital no País à MAM Asset Management, gestora de ativos do Banco Master, e fechou suas lojas.

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O sócio-fundador da Arm Gestão, Amin Murad, afirma que as empresas do setor de supermercados devem ter dívidas que sejam, no máximo, três vezes a margem EBITDA (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização), mas não é isso que tem acontecido com algumas empresas, como a St Marche.

“Há um problema grave no varejo, porque a margem dos supermercados é muito baixa. As empresas menos eficientes têm margens de 2% e as mais eficientes têm 6%. Essa margem ela não tolera muito endividamento, porque o comprometimento é imediato”, afirma.

Murad diz ainda que algumas empresas chegam a lucrar de outra forma, dependendo menos das oscilações do consumo. “Supermercado é um negócio muito apertado. Normalmente, existe um negócio de real estate (imobiliário) por trás. Os mesmos acionistas são donos de alguns ativos e alugam para esse negócio. Então, eles têm a missão de manter o negócio bem vivo, mesmo com margem pequena e com uma boa remuneração dos ativos imobiliários”, afirma.

Em levantamento feito pela RGF para o Estadão, dados do Monitor RGF da recuperação judicial, que consideram os pedidos aceitos pela Justiça, mostram que houve aumento no número de casos relacionados ao setor de supermercados e hipermercados a partir do segundo trimestre de 2024. Nesse período, o número era de 49 e subiu para 65 no quarto trimestre do ano passado.

O diretor de operações da Gouvêa Ecosystem, Eduardo Yamashita, afirma que o varejo alimentar passa globalmente por uma fase de transformação, enfrentando o problema da inflação de preços e buscando maximizar a eficiência operacional. No País, o especialista cita que o consumo tem mudado, com mais famílias indo a atacarejos à procura de preços mais baixos e com o aumento das lojas de proximidade, como a Oxxo, que também competem com os supermercados.

Yamashita afirma ainda que, diferentemente do que ocorre com outros segmentos do varejo, como o de eletrônicos, o impacto negativo do avanço das vendas via internet por empresas como Mercado Livre e Amazon ainda representa um porcentual muito pequeno para o varejo alimentar.

“Essa pressão que a gente tem visto no mercado de varejo alimentar, ela deriva muito mais dessa pressão no orçamento familiar, da diversidade de formatos, uma mudança do hábito do consumidor e das famílias, do que o próprio crescimento do digital”, diz.