Contestada pela Petlove, operação será aprovada em definitivo se não for analisada neste ano
Por Beatriz Olivon e Adriana Mattos — De Brasília e São Paulo
17/11/2025 05h02 Atualizado há 6 horas
Petz e Cobasi: faturamento conjunto das empresas no Estado de São Paulo deve ser de R$ 3,7 bilhões neste ano — Foto: Divulgação
Com uma disputa acirrada nos bastidores, o julgamento pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) da fusão entre Petz e Cobasi deve ficar para a última sessão ordinária do ano, marcada para 10 de dezembro. Essa é a expectativa que tem circulado no conselho e entre pessoas próximas ao caso. Se a operação não for julgada até o fim do ano, será aprovada em definitivo.
A aprovação sem restrições foi sugerida pela área técnica do Cade, a Superintendência Geral, mas vem sendo questionada por outros players do setor, em especial a Petlove. No órgão, está sendo discutida a possibilidade de imposição de remédios, que são medidas que o Cade coloca para afastar preocupações concorrenciais, como a venda de ativos.
Em parecer contratado pela Petlove, o ex-superintendente geral e conselheiro do Cade Carlos Ragazzo sugere que o órgão imponha uma série de restrições à fusão, como o desinvestimento em lojas, venda de uma das marcas, estoque e centros de distribuição. “Estamos olhando para uma Sadia-Perdigão”, afirmou ele ao Valor, em referência a uma operação que seria similar no grau de concentração, tamanho dos envolvidos, marcas e volume de desinvestimento necessários para afastar problemas concorrenciais. “Fica no limite da reprovação.”
A operação que criou a BR Foods foi aprovada pelo Cade em 2011 com uma série de restrições. Conselheiro na época, Ragazzo votou contra a fusão e foi voto vencido.
O professor de Direito conclui no parecer que a operação resulta em preocupações concorrenciais relevantes, sendo “impossível” a aprovação sem restrições, apontando combinação das duas maiores redes nacionais do setor. Petz e Cobasi são rivais “próximos e simétricos”, segundo Ragazzo, competindo diretamente em escala, localização e presença digital, por isso a fusão eliminaria a principal fonte de rivalidade do setor.
O parecer diz que a operação criaria uma empresa com domínio “quase absoluto” sobre o tráfego orgânico no setor, somando volumes significativamente superiores aos de qualquer rival.
Segundo o parecer, foi observado elevado incentivo para aumento de preços entre as lojas analisadas, caso a fusão seja aprovada. O documento também sugere a venda de 105 das 267 lojas somadas que as duas empresas possuem no Estado de São Paulo, o que equivale a R$ 1,4 bilhão das vendas das companhias no fim deste ano. O montante representa 37% do faturamento das empresas em São Paulo. Com isso, seriam mantidas 162 unidades das duas redes no Estado, com faturamento de R$ 2,3 bilhões, ou 63% da receita atual. Somando Petz e Cobasi, são 508 unidades no Brasil.
A venda desses ativos inviabilizaria a transação, na visão de algumas pessoas próximas à operação. Mas, ainda assim, para Ragazzo, só essa venda das lojas não seria suficiente, destacando por exemplo o volume de vendas virtuais. Para ele, outros ativos indispensáveis para a operação seriam os centros de distribuição (CDs). “Eles concentram o ganho logístico que diferencia as líderes das redes regionais”, afirma.
Cade discute a possibilidade de imposição de remédios para a operação
Do outro lado, Petz e Cobasi não viram sustentação técnica básica na análise da Petlove. “Eles sugerem questões para ficar impossível um acordo, e não tem nada a ver com defesa de concorrência ou do consumidor. Se for para vender a marca de Petz ou Cobasi e/ou ficar com R$ 1,5 bilhão a menos de venda, qual a razão de fechar um acordo?”, diz uma pessoa próxima das empresas. “A conta é que numa fusão, um mais um vire três, e pelo que eles querem, um mais um vira muito menos que um ou dois.”
As duas empresas acreditam que o documento não deve ter efeitos práticos na avaliação pelo Cade e devem agir para mostrar sua posição junto aos conselheiros.
Segundo fontes, petições encaminhadas ao Cade pelas empresas têm sido questionadas de cada lado, inclusive cálculos feitos para mostrar níveis de concentração. A Petz/Cobasi alegou, por exemplo, inversão entre denominador e numeradores em fórmulas da Petlove para medir consolidação de mercado, que chegavam a supostos cálculos errados. Advogados das empresas tratam de reanalisar contas e números de cada petição enviada para verificar eventuais “buracos” nas análises, e esclarecer eventuais dados equivocados.
Em relatório publicado na noite de quinta-feira (13), a equipe de análise do Citi informou que a Petlove sugere ao Cade ainda o fechamento total, entre São Paulo e outras regiões, de um número entre 120 e 132 lojas para que consigam aval da união de seus negócios. Essa redução equivaleria de 23% a 25% da empresa combinada ao fim deste ano, segundo projeções do banco.
Além disso, segundo o relatório intitulado “A trama se complica”, a concorrente ainda recomenda que a Petz/Cobasi venda ativos de marca, infraestrutura logística, entre outras opções para se buscar um equilíbrio de forças no mercado. A equipe de analistas formada por João Soares e Felipe Hussein lembra que o Cade se aproxima do seu prazo final prorrogado (fim de dezembro, num total de 330 dias) para decidir sobre a fusão das duas companhias varejistas.
O banco afirma que o estudo da Petlove poderia levar o órgão regulador a rever seu parecer preliminar, que inicialmente recomendava a aprovação sem restrições, mas informações apuradas pelo Valor indicam que já haveria grande probabilidade de um remédio ao acordo.
“Embora prevíssemos que a Petz/Cobasi não teria dificuldades em encontrar compradores para suas marcas fortes, o que poderia aumentar o valor arrecadado com a venda de uma marca, esse cenário provavelmente impactaria as estimativas (atualmente, o lucro líquido combinado na expectativa do Citi é de R$ 215 milhões para 2026)”, diz o banco.
“Além disso, poderia fomentar a entrada de um terceiro concorrente, mantendo a acirrada competição no mercado especializado de produtos para animais de estimação. Mantemos nossa recomendação neutra/alto risco para a Petz, reconhecendo o risco elevado decorrente dessa reavaliação”, afirma a instituição financeira.
Procurada, a Cobasi não se manifestou. A Petz também não comentou o tema.
A Petlove afirmou que “entende que a eventual aprovação exige a adoção de um remédio estrutural robusto, com alienação de ativos suficientes para criar um concorrente viável e efetivo”.