Veículo: Valor Econômico
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Data: 28/08/2025

Editoria: Shopping Pátio Higienópolis
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Criptos atraem do pequeno investidor às gigantes do varejo

As criptomoedas já entraram no dia a dia de investidores de diversos portes e assumem uma posição cada vez maior no mundo das finanças e corporações. Elas permitem que pessoas sem acesso a serviços bancários tradicionais participem do sistema financeiro. “Basta ter um smartphone e acesso à internet para enviar e receber fundos”, afirma Igor Carneiro, CEO da Vault Capital, consultoria especializada em criptoativos.

O desafio é a volatilidade das criptomoedas tradicionais, que, ao contrário das stablecoins, não são lastreadas em ativos como o dólar. “As stablecoins são uma opção mais atrativa para transações comerciais diárias. Do ponto de vista do cliente que quer utilizar criptomoedas para pagamento de produtos e serviços, o mercado já oferece algumas soluções como o cartão de débito de criptomoedas, onde o cliente mantém saldo em criptomoedas de sua preferência, mas, quando faz um pagamento, o vendedor recebe o pagamento em moeda fiduciária. É possível que esses cartões  tenham uma expansão”, avalia Henrique Garcia Pimenta, sócio da área de Mercados Financeiros e de Capitais do BMA Advogados.

Nesse novo mercado, há ganhadores e perdedores. Os bancos tradicionais e instituições financeiras, que dependem fortemente de taxas de transferência internacional e serviços de câmbio, podem ver uma redução em suas receitas, diz Carneiro. O sistema Swift, que é a espinha dorsal das transferências bancárias internacionais, já enfrenta concorrência das redes blockchain, que oferecem liquidação quase instantânea e custos mais baixos. Bancos regionais e comerciais, especialmente em mercados emergentes, podem ver uma drenagem de depósitos à medida que os consumidores transfiram fundos stablecoins.

O CEO da Vault Capital estima que as empresas que historicamente dominaram o mercado de remessas, como Western Union e MoneyGram, podem perder participação se não se adaptarem. Algumas já estão explorando parcerias com empresas de cripto para se manterem relevantes, afirma.

Grandes corporações já anunciaram que estão avaliando incorporar criptomoedas em suas operações. No caso do Uber, para transferências internacionais. O principal motivador para empresas como Walmart e Amazon é a busca por eficiência e redução de custos, defende Carneiro. O sistema financeiro, com taxas e atrasos nos pagamentos, representa um custo significativo para empresas que lidam com um volume maciço de transações.

Já a emissão de stablecoins próprias deve permitir contornar esses gargalos reduzindo custos, o que pode impactar as margens de lucro. Stablecoins próprias também podem revolucionar a gestão da cadeia de suprimentos. Pagamentos a fornecedores e parceiros em diferentes países podem ser liquidados quase instantaneamente, melhorando a eficiência operacional e a gestão do capital de giro.

O ambiente regulatório e a conformidade apresentam desafios, afirma Carneiro. A regulamentação para criptomoedas ainda está em desenvolvimento e varia muito entre os países. “A falta de clareza regulatória pode expor os usuários a riscos legais, fiscais e de conformidade. Além disso, a ausência de seguros governamentais, como o Federal Deposit Insurance Corporation [FDIC] nos EUA, significa que os fundos em stablecoins não são protegidos da mesma forma que os depósitos bancários em caso de falência do emissor.”

Para Adrian Cernev, professor de tecnologia financeira e meios de pagamento da FGV EAESP, é necessário diferenciar os conjuntos de criptomoedas. Ele diz que a regulação recém-aprovada nos EUA, o Genius Act, tirou a categorização de especulação e investimento das stablecoins e colocou elas como meio de pagamento. Não são um investimento financeiro. Há restrições para se pagar juros, por exemplo. Já uma criptomoeda como o bitcoin é e vai continuar sendo especulativo.

Outros especialistas apontam que a mera posse de stablecoins não gera juros. Para obter rendimento, é preciso participar de programas de rendimento oferecidos por corretoras, o que representa riscos adicionais. Para reserva de valor, igualmente, os números contradizem essa utilização. Basta ver, no Brasil, o descompasso entre o desempenho do dólar e o IPCA nos últimos 12 meses.

Para Cernev, o problema das criptomoedas tradicionais como o bitcoin é a volatilidade de preço. “Isso não permite que seja utilizado para o comércio. É muito arriscado. Se eu estou importando um contêiner da China em bitcoin, na hora de chegar aqui tenho que pagar, mas eu não sei qual o valor.”

Por isso, as moedas extremamente voláteis têm mais dificuldades de serem usadas no varejo e pelas pessoas no dia a dia do que as stablecoins e as CBDCs (Central Bank Digital Currency), que se assemelham em uso às stablecoins, argumenta ele. Os casos de companhias descritos acima não são isolados, ressalta Carneiro. Outras corporações e até mesmo bancos centrais estão explorando a emissão de CBDCs. “Isso mostra que a ideia da digitalização do dinheiro é um caminho sem volta.”