Veículo: Mercado & Consumo
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Data: 28/08/2025

Editoria: Shopping Pátio Higienópolis
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A polarização particular da moda no Brasil envolve luxo, crédito e valor

São 3 polos bem definidos e com performances bem distintas no atual setor de moda no Brasil.

Num dos polos está o setor de luxo, representado por marcas globais ou locais com performance muito positiva, pois parcela expressiva de seus clientes é a que mais tem se beneficiado das remunerações de aplicações financeiras. E que compra por aqui, além de trazer das cada vez mais frequentes viagens ao exterior.

Vale lembrar que, com vendas de R$ 21 bilhões anuais, o segmento de moda, vestuário e itens pessoais é um dos dois maiores no mercado total de luxo no Brasil, estimado em R$ 98 bilhões de acordo com recente estudo divulgada pela Bain & Company.

O outro polo é formado pelas mais expressivas redes nacionais ou internacionais operando no País, como Renner, Riachuelo, Marisa, Pernambucanas e C&A, que têm absoluta dependência do crédito para desenvolver negócios. Na Renner, perto de 38% do resultado têm origem nas operações financeiras, incluindo crédito. Na Riachuelo, são 32%.

Esse polo mostra vigor renovado a ponto de estimular a vinda de novos players, como a H&M, que acaba de inaugurar sua primeira loja no País, no Shopping Iguatemi, em São Paulo, buscando um posicionamento distinto daquele que a marca transmite em suas operações globais. A próxima loja abre em 4 de setembro no Shopping Anália Franco; outras serão abertas no Shopping Morumbi e, em seguida, no Parque D. Pedro, em Campinas.

A H&M se junta à Zara, Mango e outras. Nesse grupo, escala, crédito e ativação promocional de vendas no ambiente físico e digital são fatores críticos.

O terceiro polo é formado pelos operadores focados no conceito de valor.

Esse grupo pode ser subdividido em três subgrupos. O primeiro são os operadores formais atuando no plano físico e digital. O segundo grupo envolve o grupo dos informais, com expressiva e crescente participação. O último subgrupo envolve os players globais de e-commerce, como Shein, e os marketplaces que operam em zona própria.

Nesse grupo dos players digitais globais, o risco de medidas populistas de redução da tributação cria cenário de inegável e inaceitável inequidade competitiva.

O luxo tem público certo e distante do mundo real

Segundo a pesquisa desenvolvida pela Bain & Company para o jornal Valor e a Vogue divulgada na semana passada, o mercado de luxo no Brasil tem mostrado surpreendente desempenho tendo crescido 26% entre 2022 e 2024.

Dentre as razões para esse crescimento, está a concentração de renda e, especialmente, a expansão de tudo que envolve o setor financeiro.

O segmento luxo de moda e artigos pessoais, ao lado de imóveis, compõe os setores com maior participação. Ambos totalizam, somados, R$ 42 bilhões de vendas estimadas para este ano.

Segundo o mesmo estudo, os que participam desse grupo de menos de 1% da população brasileira representam aqueles que consomem a moda de luxo comprando no País, mas também comprando no exterior, nas viagens cada vez mais frequentes, que são valores não computados no estudo.

Nesse grupo, estão Louis Vuitton, Hermès, Chanel, Burberry, Prada, Dior, Hugo Boss, Bulgari e Balenciaga, atuando diretamente com operações próprias ou distribuidores e licenciados.

O crédito é o vetor diferenciador na moda massificada

As mais relevantes marcas e redes do segmento de moda massificada são diretamente dependentes do crédito no desenvolvimento dos seus negócios.

A Riachuelo tem mais de 30 milhões de cartões de crédito com sua marca. E a Renner, estimados 12 milhões.

Quem pode, desenvolve alternativas de produtos e atividades financeiras para potencializar o relacionamento, a fidelidade e a frequência de visitas às lojas e aos sites de vendas.

O setor tem experimentado recuperação positiva em relação ao passado recente, quando sofreu com a concorrência desigual dos sites globais que atuavam por aqui. Esses sites foram beneficiados por uma estrutura tributária que taxava mais as empresas que produziam e distribuíam no Brasil em relação às que traziam de fora e entregavam direto aos consumidores.

A recuperação recente tem sido também baseada na evolução dos projetos e propostas que incorporam inovações e evolução, como a recente loja conceito da C&A no Center Norte, que sinaliza ser protótipo de uma nova geração combinando design, arquitetura, tecnologia, digital e Inteligência Artificial (IA).

Apesar dos significativos avanços em produto, conceitos, loja e digital, esse polo tem profunda dependência do crédito para evoluir e se manter relevante.

No conjunto das maiores redes, a participação do crédito em operações próprias ou combinadas com operadores financeiros representa, na média, em torno de 35% a 50% das vendas, dependendo da rede. Além disso, parcela dessa venda é parcelada em valores sem juros, prática difundida no Brasil e que tem sido copiada também, mais recentemente, no exterior.

Ainda há espaço para outros players globais que ainda não chegaram, como Primark, Next, mais marcas do grupo Inditex (além de Zara) e Uniqlo, sendo que esta poderá em breve estar por aqui.

Moda de valor é o mais complexo setor

A expressiva participação da informalidade no setor de moda orientada para valor torna o setor o mais desafiador.

A parcela formal do setor de moda orientada pelo valor inclui as marcas e redes que combinam inovação constante em produto, comunicação e marketing nos pontos físicos e digitais, com operações de crédito mais limitadas. E obrigam constante e permanente atenção às relações com os consumidores para enfrentar a pressão da informalidade e a tendência à infidelidade por conta do foco no preço.

Os formais que operam nesse vetor do valor têm o maior desafio. Um fator positivo em sua expansão é o modelo de negócios de franquias e licenciamento, que, de certa forma, ajuda a reduzir as distorções enfrentadas pela informalidade.

A concorrência é a mais agressiva e multidirecional, pois envolve pequenos e médios operando na informalidade tributária e trabalhista e também os operadores globais de e-commerce, que chegam diretamente no consumidor final com inegável competência logística e operacional.

Há, ainda, toda a perspectiva da reforma tributária em implantação, que deverá ter impacto relevante nesse segmento, acumulada com o risco adicional de retorno do consentimento para menores taxas de impostos considerado por parcelas populistas do governo.

Ousar no mercado externo

Alguém com muita propriedade já disse o Brasil não é para amadores. E o setor de moda mostra o quão real pode ser a frase.

Um pouco menos no luxo, mas muito forte no massificado ou no valor.

O setor de moda no Brasil é particularmente desafiador por tudo que envolve operar num mercado volátil e com constante necessidade de renovação em cenário em que tudo pode mudar em menos de 20 minutos. E muda.

Algumas consagradas e atuantes marcas globais descobriram o quão complexo é o mercado brasileiro da moda, pois estiveram por aqui e saíram, como foi o caso de Gap, Forever 21, Topshop, Longchamp, Ralph Lauren e outras.

De outro lado, quem consegue diferenciar, inovar, jogar o jogo da moda, integrar crédito e serviços financeiros, desenvolver novos conceitos de lojas integradas com e-commerce e digital e manter-se próximo e relevante para o consumidor tem também reais perspectivas de expansão no mercado externo. Como já tem sido ensaiado por alguns grupos e com resultados positivos, como Renner, Farm, Osklen, Reserva, Animale e outras.

A polarização particular da moda é um especial teste de competência, visão e capacidade de constante inovação.