O uso diário, cada vez mais frequente, de roupas inspiradas em esportes, a inovação em materiais e a busca crescente por bem-estar estão impulsionando o mercado de moda. Marcas nacionais como Live!, Olympikus e Reserva, e gigantes globais como On e Puma, disputam espaço nesse setor que movimentou no Brasil US$ 4,57 bilhões no ano passado e pode atingir US$ 6,68 bilhões até 2033, segundo dados do International Market Analysis Research and Consulting Group (Imarc).
No mercado global, foram em US$ 402,5 bilhões em 2024 e a projeção para 2033 é de US$ 731,8 bilhões.
O avanço pode ser observado em marcas nacionais e também em grifes internacionais que expandem sua atuação no país.
No pano de fundo, 31% dos adultos no mundo, cerca de 1,8 bilhão de pessoas, praticam pouco exercício físico, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Há, portanto, potencial para crescimento da prática esportiva e das vendas de roupas e calçados desse estilo.
A prática regular de exercícios passou a ser recomendação médica e integra outra tendência em alta: o autocuidado, que conecta saúde física e mental ao estilo de vida e influencia diretamente escolhas de consumo.
Fundada em 2000, em Jaraguá do Sul (SC), pelo casal Joice e Gabriel Sens, a Live! fechou 2024 com faturamento de R$ 725 milhões e mira R$ 1 bilhão em 2025, segundo Joice, que é a diretora criativa. A marca cresce 45% ao ano, em média, conta com 3 mil colaboradores e ocupa um complexo de 80 mil m² com 320 lojas – 100 próprias e o restante franqueadas.
Joice observa de perto uma tendência que ganhou impulso nos últimos anos, com a popularização dos treinos de corrida em grupo: “Há uma busca maior por autoconhecimento e menos comparação e disputa.”
A Live! acompanhou a transformação de comportamento trazida pela pandemia – quando o conforto em casa virou prioridade e, ao sair, o consumidor buscou unir estilo e funcionalidade. Executivo-chefe (CEO) da Live!, Gabriel percebeu o aumento do uso de roupas de academia de ginástica nas ruas, no trabalho, no lazer. E o crescimento de prescrições médicas que incluíam atividade física.
Hoje, o comércio eletrônico responde por 20% das vendas de moda esportiva da Live!, enquanto o movimento de internacionalização da empresa avança. A marca já tem lojas próprias em Miami e Dubai e planeja abrir uma unidade na Tailândia em setembro.
Marcas consolidadas no mercado esportivo também acompanham a tendência. Segundo Pedro Bartelle, CEO da Vulcabras – que opera no país as marcas Olympikus, Under Armour e Mizuno -, a aproximação entre esporte e moda casual já é realidade e vem sendo explorada em seu portfólio.
O relatório “Year in Sport 2024”, do site Strava – maior plataforma esportiva do mundo -, mostra que a corrida é o esporte mais praticado no Brasil, com mais de 19 milhões de praticantes. E nos últimos dois anos, o Olympikus Corre – tênis de alta performance da marca – foi o mais usado por corredores brasileiros, segundo o Strava. “Esse reconhecimento reforça nosso compromisso com o desenvolvimento de produtos que unem inovação e tecnologia para democratizar a alta performance”, diz Bartelle. O grupo investiu R$ 750 milhões em inovação e ampliação da capacidade produtiva nos últimos cinco anos, incluindo novas linhas de produção e modernização de fábricas.
A suíça On, especializada em tênis e vestuário de performance com apelo casual, planeja abrir sua primeira loja no Brasil no próximo ano. “Cada vez mais o esporte casual se consolida como estilo de vida”, diz Alexandre Knebel, diretor de marketing da On no país. As vendas da marca dobram anualmente no mercado brasileiro.
“Hoje, a pessoa sai do parque e vai direto para o restaurante, sem precisar se trocar. O conforto virou prioridade desde a pandemia”, diz Knebel. As colaborações são outro pilar estratégico. Entre os parceiros da empresa estão a grife espanhola Loewe, do grupo LVMH, e a sul-coreana Post Archive Faction (PAF), que combina design minimalista com alta performance.
Desde 2016, a On vem expandindo a operação de vestuário. Há dois anos, contratou o designer belga Tim Coppens para criar coleções que combinem roupas esportivas de alta tecnologia e moda cotidiana premium.
Acompanhando essa tendência que une funcionalidade e estilo de vida saudável, a Reserva se prepara para lançar a Reserva Sprint, linha focada em roupas tecnológicas para prática esportiva. Segundo Joana Bittencourt, diretora das marcas da Reserva, pesquisa feita com clientes revelou que 75% praticam exercícios ao menos quatro vezes por semana. A mesma pesquisa indicou uma mudança duradoura nos hábitos desde a pandemia.
“O consumidor experimentou a liberdade de vestir algo confortável e funcional, e isso se manteve. Hoje, ele busca tecidos tecnológicos que não amassam e acompanham o ritmo de um dia que vai do treino ao trabalho e ao lazer”, diz Bittencourt.
O dinamismo do setor também se reflete nas estratégias das marcas globais. Segundo Luciana Soares, diretora de marketing da Puma, o consumidor contemporâneo busca fluidez entre ambientes, papéis e estilos. O equilíbrio entre moda, desempenho e propósito está no centro das criações da marca. “Desenvolvemos peças que combinam tecnologia esportiva, conforto extremo e design urbano, permitindo que nossos consumidores se movimentem com liberdade e identidade, mantendo seu estilo”, diz a executiva.
A campanha publicitária global “Go Wild” busca aproximar a Puma do consumidor comum. “Em um cenário em que todo mundo se sente pressionado a performar o tempo todo, escolhemos valorizar o atleta comum, aquele que equilibra rotina, família e trabalho, e mesmo assim encontra espaço para correr no parque”, explica Soares. No filme da campanha, corredores reais foram protagonistas, substituindo modelos e atletas profissionais.
Para Sofia Martellini, estrategista sênior da consultoria WGSN, o conforto segue como prioridade para o consumidor, mas seu significado evoluiu: “Vemos mais funcionalidade nos designs, com modelagens ergonômicas, ajustes personalizados e materiais inteligentes, como tecidos antiodor e de absorção avançada.” Martellini destaca ainda o crescimento de nichos específicos, como tênis projetados para mulheres ou para diferentes faixas etárias, e o investimento das marcas em experiências e produtos que fomentem conexões entre praticantes.
Martellini cita também a influência de esportes de clube, como golfe e tênis, que têm impulsionado um visual mais alinhado e refinado no “streetwear”. A interseção entre esporte, moda e cultura pop é outro fator que molda o setor. “Atletas se tornaram influenciadores de moda e estilo de vida, e não apenas referências por sua performance”, afirma. Para ela, marcas que criam narrativas locais e apoiam atletas e estéticas regionais conquistam mais engajamento.
Entre as tendências emergentes, a WGSN aponta o aumento da prática esportiva noturna, motivada pelas temperaturas extremas no verão, o que deve influenciar o design de produtos, como peças com detalhes refletores de alta visibilidade.
Com um mercado em expansão e consumidores cada vez mais exigentes – em termos de estilo, funcionalidade e propósito -, as marcas estão focando em inovação, autenticidade e agilidade estratégica.