A Microsoft está “prosperando”, segundo seu executivo-chefe, Satya Nadella. Seus lucros trimestrais cresceram quase 25% e seu valor de mercado chegou a US$ 4 trilhões na semana passada. Em uma situação normal, pareceria incongruente que a empresa estivesse, ao mesmo tempo, eliminando milhares de empregos.
A busca por uma força de trabalho mais enxuta não é nenhuma novidade. Em tempos de incerteza econômica, as empresas reduzem o número de funcionários e eliminam ineficiências. Mas hoje não se trata apenas de fazer mais com menos pessoas. As empresas se preparam para um cenário em que poderá haver menos trabalho para seus funcionários.
Mesmo com líderes empresariais afirmando que a inteligência artificial (IA) está “redesenhando” empregos, em vez de cortá-los, as manchetes contam outra história. E não é só a Microsoft: Intel, BT e outras grandes empresas estão entre as que anunciaram milhares de demissões explicitamente ligadas à IA. Antes, cortes de pessoal eram anunciados como decisões lamentáveis. Agora, os executivos os tratam como um sinal de progresso. As empresas estão buscando lucros maiores com menos pessoas.
Para o setor de tecnologia, a receita por funcionário tornou-se uma medida de desempenho valorizada. Startups da Y Combinator se orgulham de construir empresas com equipes enxutas. Sam Altman, da OpenAI, foi mais longe, prevendo o surgimento, em algum momento, de uma empresa de US$ 1 bilhão comandada por uma única pessoa. Pode parecer exagero, mas é inegável que os modelos de linguagem ampla já estão transformando o trabalho de escritório.
Os profissionais mais jovens deveriam estar particularmente atentos. Degraus inteiros da escada corporativa estão sendo eliminados, enfraquecendo os caminhos tradicionais de progressão na carreira. Isso não se deve apenas à IA. A terceirização internacional, a disciplina orçamentária pós-covid e anos de crescimento fraco já vinham tornando os cargos de início de carreira os primeiros a serem cortados. Mas a IA está aumentando essa pressão.
Dick Hahn, executivo-chefe da empresa de recrutamento Hays, me disse: “Embora haja exceções, o avanço da IA poderá limitar a recuperação de certos cargos administrativos de nível júnior”. O desenvolvimento profissional e as trilhas de formação de lideranças precisarão ser redefinidos.
As carreiras já estão se tornando cada vez mais “não lineares” – com trajetórias irregulares. O crescimento do trabalho freelance e a contratação por projeto já fragmentou, em muitos casos, a natureza do trabalho. A IA apenas vai acelerar esse processo.
Tomadas de decisão mais rápidas e custos indiretos menores são ótimos, mas isso também pode significar menos recursos para pesquisa e desenvolvimento, departamentos jurídicos ou de conformidade.
Alguns estão começando a recuar. É o caso da empresa de pagamentos Klarna, que usou a IA para reduzir sua força de trabalho em milhares de postos e agora está testando a recontratação de pessoas para reforçar o atendimento aos clientes.
Os executivos de tecnologia que exaltam empresas com pouca gente subestimam a complexidade das operações e das culturas corporativas, que se baseiam em relações e interações profundamente humanas. Embora a IA possa lidar com as tarefas repetitivas, deveria haver um novo valor atribuído ao elemento humano – da criatividade e inteligência emocional ao julgamento complexo. Mas isso só será possível se investirmos nas pessoas que possuem essas qualidades e na formação da próxima geração de trabalhadores – e, neste momento, essa porta está se fechando para muitos deles. (Tradução de Mario Zamarian).