Diversas entidades do varejo e da indústria de consumo se articularam nos últimos dias para tentar calcular efeitos do tarifaço americano no mercado interno, apurou o Valor. Um estudo começou a ser elaborado, com apoio de consultores, e deve ser enviado ao governo nos próximos dias.
O texto, obtido pelo Valor, defende medidas de estímulo aos negócios, como suspensão da elevação do IOF, o imposto sobre transações financeiras, e apoio financeiro aos segmentos que vendem no país e empregam trabalhadores, como por meio de linhas de apoio ao ACC, o adiantamento de contratos de câmbio.
Ainda falam em simplificação na contratação de funcionários na base CLT, o contrato formalizado no país, o que pode ajudar a absorver empregados que forem demitidos durante o tarifaço.
Ainda não está definido quem assinará o material, mas o entendimento de que haverá impactos no mercado doméstico é unânime, mesmo com as exceções de setores informadas, e é preciso união das associações, dizem fontes. Café, frutas, carnes e toda a parte de produtos industriais vão estar dentro da tarifa total de 50%.
Já começaram a ser anunciadas demissões de pessoal em áreas que não entraram na lista de exceções do governo dos Estados Unidos, como no setor de pescados e móveis, que impactam rendimento e consumo. Há receio de consequências no cenário de confiança do consumidor na economia, e como isso afetaria os gastos das famílias.
Na projeção de cenários, mesmo com um pacote antitarifaço, e com absorção de parte das exportações para mercado interno, o efeito sobre o Produto Interno Bruto (PIB) seria zerado só após 18 meses, no começo de 2027, relata o manifesto.
As 16 entidades envolvidas na discussão conversam sobre um possível apoio coletivo ao manifesto nos próximos dias, mas o manifesto já foi aprovado em reunião no dia 28, dizem fontes.
Fazem parte das discussões as entidades do fórum da cadeia de abastecimento, que inclui os setores de supermercados (Abras), indústria de alimentos (Abia), restaurantes (ANR), café (Abic), embalagens (Abre), milho (Abramilho), higiene e limpeza (Abihpec), entre outras. O material teve apoio da RC Consultores, do economista Paulo Rabello de Castro.
Projeções foram feitas antes do anúncio das isenções na quarta-feira (30), mas o impacto dessas exceções não muda o foco central que é apoio à ações de estimulo à economia, segundo fontes ouvidas. São quatro mil itens exportados do Brasil aos EUA, e houve 694 exceções.
Isso representa menos da metade (cerca de 40%) do impacto calculado inicialmente na economia brasileira com a sobretaxa, segundo a Leme Consultores.
Efeitos no tempo
No curtíssimo prazo, num período de até seis meses, o impacto negativo seria relevante mesmo com absorção de parte da produção pelo país e com ajuda do plano emergencial.
Com o passar dos meses, com medidas do pacote e com o avanço do mercado interno, a absorção dos produtos da pauta exportadora pode ajudar, reduzindo consequências sobre o PIB, mas com impacto zerado nesse indicador só após um ano e meio.
Nesse intervalo de até 18 meses, já devem existir setores em melhor situação, mas em ritmos distintos, com outros ainda impactados, por isso um ambiente positivo generalizado se daria com mais tempo.
Na prática, há setores, como carne, café, móveis e têxteis, que já admitiram dificuldades em desviar mercadorias ao país, por causa do grande volume que exportam, e porque isso derrubaria preços. E também por conta de especificidades de mercadorias feitas para as empresas nos EUA, então essa reorganização não é tão simples.
Já mais no médio prazo, segundo o material, as políticas públicas para apoiar as exportadoras aumentarão a capacidade de crescimento do PIB, com um efeito positivo após 30 meses.
Segundo o material, os impactos do tarifaço de Trump deixarão prejuízos para a economia, mas as sequelas serão atenuadas no período de 30 meses com a adoção de políticas públicas de fortalecimento do mercado interno.
Os setores também voltaram a retomar no manifesto pautas já difundidas, de redução da taxa de juros — em elevação desde o fim de 2024, por conta da escalada inflacionária — e barateamento do crédito privado, num conjunto de nove medidas.