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Data: 30/07/2025

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Copom deve manter a Selic em 15%, em meio às incertezas sobre o tarifaço de Donald Trump

 O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central começa nesta terça-feira, 29, a reunião para definir a nova taxa Selic, que será anunciada no fim da tarde de quarta-feira, 30. Para o mercado financeiro, não há mistério sobre esse número: é unânime a expectativa entre os analistas de que o juro será mantido em 15% ao ano.

As dúvidas são quando o BC começará a reduzir essa taxa e, principalmente, quanto os eventos recentes no cenário, principalmente a ameaça do presidente americano, Donald Trump, de impor tarifa de 50% aos produtos brasileiros, vão influenciar nos passos seguintes.

Integrantes do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, que vai definir a Selic na quarta-feira, 30
Integrantes do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, que vai definir a Selic na quarta-feira, 30 Foto: Raphael Ribeiro/BC

A avaliação dos economistas é que a turbulência no cenário internacional imprime ainda mais incerteza a um quadro macroeconômico interno já conturbado e, por isso, o Copom também não deve se comprometer com os passos futuros da política monetária no comunicado que será divulgado na quarta-feira.

Os analistas lembram que o tarifaço de Trump ainda não terá entrado em vigor no momento da decisão do colegiado. Por isso, seus efeitos ainda não estão claros.

“O mais natural é esperar um discurso neutro (do BC), sem ter muito viés de ação para os próximos passos”, diz a chefe de macroeconomia para o Brasil do UBS Global Wealth Management, Solange Srour, destacando que a desancoragem das expectativas permanece como desafio para o Comitê.

Desde a última reunião do Copom, no dia 18 de junho, as medianas do relatório Focus para o IPCA de 2025 e 2026 oscilaram para baixo, de 5,25% e 4,50% para 5,09% e 4,44%, respectivamente, mas continuam sensivelmente acima do centro da meta de inflação perseguida pelo BC, de 3%. A cotação do dólar usada no cenário de referência do Copom passou de R$ 5,60 para R$ 5,55.

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O Índice de Atividade Econômica do BC (IBC-Br), uma espécie de prévia do PIB, caiu 0,74% em maio, abaixo do piso das estimativas do mercado. O Copom já mencionou que o arrefecimento da atividade é um “elemento essencial” do processo de convergência da inflação à meta.

No último dia 18, dois grupos de economistas do mercado financeiro relataram, em reuniões fechadas com diretores do BC, a expectativa de desaceleração mais rápida da inflação, com sinais mais claros de arrefecimento na atividade econômica.

As próprias tarifas americanas, se aplicadas, resultariam em uma diminuição do Produto Interno Bruto (PIB) e um aumento da oferta de produtos no mercado doméstico, contribuindo para reduzir o IPCA, o índice “oficial” da inflação no País.

Mas o BC ainda tem outros desafios no horizonte. Em primeiro lugar, porque as expectativas de inflação podem ter caído, mas continuam acima do centro da meta, mesmo em horizontes mais longos.

A resiliência do mercado de trabalho permanece, com a taxa de desemprego orbitando os menores níveis da série histórica. E uma retaliação aos EUA poderia colocar em xeque o efeito desinflacionário das tarifas.

“Se formos para um cenário mais adverso, que não pode ser descartado, retaliando mesmo que de forma não tarifária, e recebendo sanções além das tarifárias, o efeito desinflacionário pode ficar em xeque, porque podemos ter um aumento no prêmio de risco, e esse cenário de dólar fraco pode se inverter para o Brasil”, diz Srour. “Acho que o Copom vai colocar um risco em relação às tarifas, sem dar muito viés.”

O economista sênior e sócio da Tendências Consultoria Integrada Silvio Campos Neto também avalia que a evolução dos dados e indicadores até aqui indicam a manutenção de um discurso mais cauteloso por parte do Copom.

Mantendo o mesmo tom das últimas reuniões, o Comitê evitaria abrir qualquer flanco para permitir uma mudança na precificação do mercado, ele diz.

“Ele poderia, inclusive, manter a sinalização de que, em caso de necessidade, estaria pronto para aumentar a taxa Selic. É uma coisa pouco provável, e eu diria até que improvável. Mas pode usar essa sinalização para minimizar a percepção, no mercado, de que uma queda dos juros estaria próxima”, afirma o analista.

Juros parados

Das 44 instituições consultadas pelo Projeções Broadcast, 36 veem a Selic estacionada no atual nível pelo menos até o final do ano. Oito casas, porém, veem início do afrouxamento monetário ainda neste ano: sete em dezembro e uma em novembro.

O economista-chefe para Brasil do Barclays, Roberto Secemski, é um dos que projetam que a Selic ficará em 15% até março do ano que vem.

Ele destaca que o horizonte relevante da política monetária está se movendo para o primeiro trimestre de 2027, período para o qual o BC estima uma inflação de 3,4%, ainda acima do centro da meta, de 3%, o que justifica a necessidade da manutenção do aperto monetário nos atuais níveis.

“Não vemos nenhuma mudança relevante nessa projeção deles para os próximos meses”, diz Secemski, citando que vetores como o câmbio, que vinha ajudando na moderação das projeções de inflação desde o início do ano, passou a ser mais um foco de incerteza após o novo anúncio de tarifaço dos EUA.

“O dólar chegou a ir na direção dos R$ 5,40 e, após as tarifas, subiu para quase R$ 5,60 e se acomodou perto disso”, diz ele, que ainda observa que as tarifas podem exigir um auxílio do governo aos setores mais afetados, gerando algum custo fiscal.

O economista-chefe do Banco Daycoval, Rafael Cardoso, vai na mesma linha e projeta que a Selic ficará parada nos atuais 15% até o primeiro trimestre de 2026. Além das reiteradas sinalizações do BC de juro parado por “período prolongado”, ele cita que deve haver uma materialização mais clara da perda de tração da atividade doméstica antes de qualquer discussão sobre afrouxamento monetário.

“Acreditamos que o desenrolar do cenário, com a desaceleração da atividade e a inflação mais baixa no segundo semestre, ajude a manter as expectativas mais comportadas. Ao mesmo tempo, o BC vai vislumbrar em seus modelos uma inflação mais próxima à meta no começo do próximo ano”, diz o economista.

Para ele, porém, há possibilidade de esse início do ciclo de cortes ser adiado, caso a economia e a inflação não percam força conforme o esperado.

Para Nicolas Borsoi, economista-chefe da Nova Futura Investimentos, a janela para início do ciclo dos cortes de juros deverá estar aberta já no último mês deste ano. Ele não espera, porém, que o BC emita qualquer sinalização nesse sentido já na comunicação da reunião desta semana.

“O BC deve evitar ao máximo fazer grandes mudanças no tom da comunicação. Obviamente que houve acontecimentos importantes, principalmente o tarifaço dos EUA, mas a postura deve ser a de não mexer muito no comunicado.”

Ainda assim, Borsoi avalia que movimentos recentes de deflações fortes nos preços no atacado devem ajudar a moderar o IPCA corrente ao longo do segundo semestre. Isso, aliado a uma atividade doméstica que já começou a apontar para baixo em alguns dados importantes no segundo trimestre tende a dar conforto ao BC para começar a cortar os juros, ainda que de maneira parcimoniosa.

“Temos essa visão mais construtiva de que não será preciso aguardar até o fim do ano que vem para cortar juros”, diz ele, que projeta Selic de 14,75% no fim de 2025 e de 12,5% no fim de 2026.