Apesar de os Fundos de Investimentos em Direitos Creditórios (FIDCs) terem sido abertos ao investidor de varejo com a Resolução 175, da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), em outubro de 2023, algumas características ainda limitam a popularização do produto, como a complexidade e o baixo nível de educação financeira do público. Ainda assim, o mercado mantém uma visão otimista sobre o crescimento desse tipo de investimento nos próximos anos.
Com ampla e crescente adesão no segmento profissional, os FIDCs ganharam espaço pela resiliência e rentabilidade. São fundos que investem em “direitos de receber dinheiro”, como parcelas de cartão, boletos, financiamentos ou empréstimos. Com isso, quem vende a dívida (como empresas) consegue antecipar valores que receberá no futuro, enquanto os investidores ganham com os juros embutidos.
Esse tipo de fundo, restrito a investidores profissionais e qualificados até 2023, passou a ser liberado para o público em geral por meio da resolução da CVM, mas com algumas restrições para proteger o pequeno investidor.
A regra prevê que pessoas físicas só podem investir em cotas seniores de FIDCs, que são aquelas com prioridade no recebimento de juros e amortizações e, por isso, são mais fáceis de resgatar. Além disso, o FIDC só pode ter na carteira créditos já performados, o que limita a oferta, uma vez que esse tipo de recebível não é tão comum no mercado. Outra exigência é que o FIDC tenha uma nota de crédito (“rating”) atribuída por agências especializadas que avaliam o risco.
Para Felipe Prado, sócio do BMA Advogados, o maior gargalo está na parte da oferta pública do fundo, com a indisponibilidade de registro automático para varejo. “Quando você vai fazer uma oferta de FIDC com cotas para o público em geral, a primeira oferta pública necessariamente tem que ser via rito ordinário na CVM, que é um prazo mais longo de análise”, diz.
Na avaliação do sócio de mercado de capitais do Bocater Advogados, Matheus Corredato Rossi, o que mais pesa é a “forte competição” por bons recebíveis, a exigência de estruturas com segurança jurídica e, principalmente, a baixa liquidez dos FIDCs. “Eles têm prazos de resgate mais longos, o que ainda afasta o investidor de varejo, que prefere aplicações mais líquidas e atreladas ao CDI”, afirma.
Mas o cenário tende a mudar à medida que o mercado amadurece, afirma Caio Ferreira Silva, sócio do Pinheiro Neto Advogados. “Com o passar do tempo, o amadurecimento do público pessoa física e do mercado, algumas dessas exigências regulatórias vão ser flexibilizadas, de maneira a tornar ainda mais atrativo o FIDC para a pessoa física e potencialmente tão flexível quanto FIDCs que hoje estão restritos para profissionais e qualificados.”
Os FIDCs têm prazos de resgate mais longos, o que ainda afasta o investidor de varejo”
— Matheus Rossi
Os FIDCs destinados a investidores profissionais têm regras mais simples e podem fazer ofertas privadas sem registro público e com menos exigências de divulgação, porque investidores qualificados são considerados capazes de avaliar riscos sem tanta supervisão. Isso torna o processo mais ágil e barato.
Mesmo com as restrições, os investimentos em FIDCs de varejo cresceram quase oito vezes desde que a modalidade passou a ser permitida: em abril de 2025, o volume financeiro totalizou R$ 24,26 bilhões, contra R$ 3,18 bilhões em outubro de 2023, de acordo com dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) compilados a pedido do Valor.
Esse volume, porém, não representa apenas investimentos diretos. Também contém aportes de outros fundos que investem em FIDCs para varejo, como Fundos de Investimento em Cotas (FICs) e Fundos de Fundos (FOFs). Basicamente, esse vem sendo o meio de democratizar o acesso ao produto. Mas o método também recebe críticas.
Na visão do cofundador da Liberum Ratings, Decio Baptista, essa estrutura traz mais riscos para o investidor pessoa física, porque não tem a exigência de rating. “Apesar de um FIC ou de um FOF ser considerado um investidor profissional, e nesse caso o rating é opcional, queremos mostrar ao mercado que o rating não é uma questão de obrigatoriedade, mas de boa governança”, afirma.
Baptista completa que esse método também implica maiores custos na ponta. “As cadeias de fundos geram múltiplas taxas, reduzindo o valor final para o investidor”, diz. Ele completa que a transparência e a governança são essenciais para informar os investidores, reduzir assimetrias de informação e melhorar a tomada de decisão.