O plano de retorno do empresário Michael Klein à Casas Bahia deve passar pela decisão de bancos credores da rede de converter dívida em ações, segundo apurou o Valor.
Se a conversão avançar, nas conversas entre a empresa e bancos, é algo que, de forma indireta, pode ser benéfico ao projeto do empresário.
Klein quer elevar mais a sua posição acionária na varejista — ele tem 11% das ONs, um pouco acima do último informe oficial na B3, e equivalente a 10,5 milhões de papéis. E continua no seu radar a volta ao conselho de administração, podendo, inclusive, chegar a ter até três cadeiras num colegiado com cinco membros.
Maior acionista individual da varejista, Klein hoje tem direito a uma vaga, ocupada por Andre Coji, e deixou o conselho cinco anos atrás, após divergências por questões familiares com o filho Raphael Klein, algo que acabou se agravando por diferenças de visão sobre a condução do negócio. Os dois não se falam há cerca de quatro anos.
A questão é que, para elevar a sua posição, frente ao nível de liquidez atual do papel no mercado, comprar 1% ou 2% a mais faria as ações dispararem, encarecendo a transação. Foi o que aconteceu quando ele comprou 1% do capital na última semana de março, indo a 10% das ONs.
No fim de março, o papel valorizou-se 44% e foi a R$ 10,21, e hoje está em R$ 5,39. Mais de 20% das ações da companhia são alugadas.
Para desatar esse nó, há um caminho possível, e no radar de Klein, que envolveria a conversão, por parte dos credores Banco do Brasil (BB) e Bradesco, de parte das dívidas em ações da companhia a partir de outubro.
Isso é permitido pelo contrato, fechado pela empresa em abril de 2024, que respaldou a recuperação extrajudicial, e que envolveu três emissões de debentures.
Pelas condições de uma das séries de debêntures, a partir de outubro as conversões podem ser feitas pelos bancos a cada 90 dias, de forma consecutiva, até 2027, em seis janelas trimestrais.
Dessa forma, com mais papéis circulando no mercado, Klein poderia aumentar sua fatia aos poucos, comprando as ONs em bolsa, sem tanta pressão no preço.
Uma fonte consultada afirma que Klein já fez contatos com os bancos, para entender o cenário atual, e a resposta foi que não podem abrir detalhes da estratégia — inclusive, considerando que ainda há prazo para exercerem o direito, a questão teria espaço para evoluir.
Acontece que isso pode até acabar evoluindo mais rápido, segundo duas fontes ouvidas.
A reportagem apurou que, nos contatos com a rede, os credores considerariam a hipótese de converter a dívida em ação já no curto prazo, dentro do limite definido em contrato. Eles acreditam que a melhora no preço do papel neste ano, e o avanço no desempenho operacional abrem espaço para sair via venda de ações.
Bradesco e BB tem 54% da dívida da empresa, equivalente a cerca de R$ 2,2 bilhões.
Mas já há um entendimento prévio que seria preciso definir um período de “lock up”, com intervalo bloqueado para a venda das ações pelos bancos, para evitar depreciação forte dos papéis. Até o momento, ainda não está definido esse “lock up”.
A varejista tem interesse nisso porque reduziria o peso dos juros sobre as dívidas, e aceleraria a recuperação da rede.
Risco de diluição
Mesmo que, a princípio, o empresário seja diluído na conversão pelos bancos, esse efeito não é visto como um impeditivo para a transação pelo empresário, apurou o Valor.
“Todo mundo sai ganhando, porque os bancos já põem dinheiro em caixa, Michael consegue reforçar sua posição e a empresa ainda reduz pagamento de juros sobre a dívida e fica numa situação muito melhor”, diz uma pessoa a par do plano.
Se esse capítulo junto aos bancos for resolvido nos próximos meses, Klein poderia elevar sua posição para entre 20% e 30% do capital, diz uma fonte, o que lhe daria direito a até três cadeiras no colegiado.
É por isso que o empresário teria comentado, em conversa recente com conselheiros, que daria um ano de prazo para a rede apresentar melhores números, e então poderia voltar ao grupo.
Mudanças à vista?
Um ponto ainda em aberto teria a ver com mudanças que podem ser feitas na empresa, caso Klein realmente consiga avançar com a sua volta à varejista.
Há interlocutores a par do assunto que dizem que Klein quer acelerar cortes de despesas e fechar mais lojas em má situação operacional, que ainda estariam drenando o caixa. Eram 1.078 lojas no fim de 2023 e um ano depois, eram 1.064 pontos.
O empresário ainda buscaria ter mais força no colegiado para colocar nomes de primeira linha no órgão, como membros independentes, que tenham visão estratégica e da operação do negócio de varejo.
Há um incômodo grande de Klein com o fato de a Casas Bahia não ter membros no conselho com um histórico mais longo no setor, e conhecimento em logística, expansão e lojas.
Se esse conselho ideal vai sair do papel, ou se esse plano avançará, é algo que depende de um encaixe dessas variáveis todas, mas é fato que pela primeira vez em cinco anos, Michael Klein tem uma estratégia clara na cabeça.
Procurados, Bradesco e BB preferiram não comentar.
O empresário Michael Klein disse, em nota, que acredita em decisões que possam ajudar a companhia a retomar seu elevado patamar no varejo brasileiro. O Grupo Casas Bahia tem grande potencial nesse sentido, acrescentou.
Remuneração resolvida
Na quarta-feira (29), a Casas Bahia aprovou, por maioria de votos na assembleia geral ordinária (AGO), uma proposta para manter, em 2025, o teto da remuneração sugerida em 2024.
A questão dos salários, bônus e incentivos deste ano vinha sendo um ponto de divergência entre o atual conselho e Klein, desde que a administração propôs, em março, um aumento de até 40% na remuneração do colegiado em 2025, formado por cinco membros.
A Casas Bahia não paga dividendos há anos, e, além do aumento, a decisão de criar um novo bônus, de quase R$ 1 milhão por conselheiro, incomodou os acionistas da rede, como Rafael Ferri e Michael Klein.
“Primeiro a empresa tem que voltar a lucrar para aí, se dar algum bônus, porque bônus é mérito. É fato que os números melhoraram, e o trabalho deixa a gente muito mais otimista, mas a empresa ainda está no vermelho”, diz um acionista.
Na quarta-feira, foi Klein que apresentou uma proposta na AGO para manter, para este ano, o teto da remuneração sugerida em 2024, como o Valor antecipou ontem.
Apesar dessas diferenças entre Klein a parte do conselho, na prática, o momento atual é de um maior entendimento entre ambos, desde que Klein decidiu retirar seu pedido de chamada de uma assembleia para mudar o conselho, como já noticiado neste mês.