O cenário atual do Brasil, que combina aumento da renda disponível real das famílias e concessões de crédito em níveis elevados, tem ajudado o varejo a apresentar um crescimento mais homogêneo e disseminado ao longo do ano, apontam economistas.
Os segmentos com desempenho mais estável em 2024, em geral, são aqueles atrelados à renda, o que conversa com o aquecimento do mercado de trabalho, diz Geórgia Veloso, economista do Instituto Brasileiro de Economia (FGV Ibre). Mas segmentos atrelados ao crédito também têm apresentado resultados relativamente melhores, afirma a economista.
“Assim, começamos a observar resultados ligeiramente mais homogêneos no varejo”, diz Veloso.
Por um lado, o avanço dos salários e da ocupação e os programas de transferência de renda têm mantido as condições de as famílias adquirirem itens básicos, como alimentos e remédios.
No ano até julho, o volume de vendas da categoria do IBGE que inclui supermercados, produtos alimentícios e bebidas sobe 5,6%, ante igual período de 2023. Já o grupo que contém artigos farmacêuticos e médicos avança 14,3%. Ambos crescem acima da média do varejo ampliado, de 4,7%.
Cristiano Santos, gerente da Pesquisa Mensal do Comércio (PMC) do IBGE, diz, no entanto, que o crescimento do varejo em 2024 está mais disseminado. “Os carros-chefes são os hiper e supermercados e os artigos farmacêuticos, médicos e de perfumaria. Eles funcionam como duas âncoras, um pouco como aconteceu em 2023. Mas, em 2024, há uma distribuição mais positiva, a maioria das atividades cresce”, afirma.
As vendas de veículos, motos, partes e peças, por exemplo, acumulam alta de 13,4% no ano até julho. A categoria tem respondido ao impulso no crédito à pessoa física para aquisição de veículos, cujas concessões crescem 33% no ano até julho, ante o mesmo período de 2023, e a carteira se expande mais de 18% nos últimos 12 meses, segundo Caio Napoleão, economista da MCM Consultores.
“Montadoras que detêm instituições financeiras próprias têm oferecido condições especiais de taxas de juros, abaixo do mercado, para reduzir a dependência em relação às locadoras”, afirma.
O desempenho das vendas de veículos tem impulsionado todo o agregado de bens sensíveis a crédito nos últimos meses, aponta Napoleão. Pelos seus cálculos, esse grupo de itens cresceu 15,9% em julho deste ano, na comparação com mês equivalente de 2023, depois de subir ao redor de 6% em maio e em junho.
“Mas, mesmo quando a categoria é excluída da conta, os demais bens ligados ao crédito — bens duráveis e de maior tíquete — apresentam desempenho mais consistente do que aqueles tradicionalmente ligados à renda”, diz Napoleão.
Em julho de 2024, a venda de bens sensíveis a crédito sem considerar veículos subiu 9,3%, ante julho de 2023, vindo de alta de 4,9% em junho, segundo a MCM. Já os bens sensíveis à renda subiram 0,1% em junho e 3,3% em julho, sempre na comparação com mês equivalente de 2023.
Além do impulso em veículos, Napoleão diz que a maior consistência nas vendas de bens ligados a crédito mais recentemente pode ter relação com a necessidade de reposição e reconstrução e com o auxílio financeiro federal às famílias atingidas pela enchentes no Rio Grande do Sul, o que impacta positivamente o comércio de material de construção e de móveis e eletrodomésticos.
Em julho, as vendas de móveis e eletrodomésticos subiram 1,4%, na comparação com o mês imediatamente anterior. Embora o número represente metade da taxa observada em junho, o segmento segue operando no campo positivo a despeito de vetores contrários, como a taxa de juros ainda em território “significativamente restritivo”, diz Carla Argenta, economista-chefe da CM Capital.