O grupo de atacarejo AssaíCotação de Assaí deve comunicar nesta segunda-feira (2) ao mercado a entrada de José Roberto Müssnich na empresa, como membro independente do conselho de administração, numa das principais transações envolvendo lideranças do setor neste ano, apurou o Valor.
Müssnich foi, por mais de uma década, o cérebro por trás do Atacadão, a maior empresa de atacarejo do Brasil, e transformou o negócio no motor principal de crescimento do grupo CarrefourCotação de Carrefour no Brasil.
O anúncio acontece no dia seguinte após o fim do período de “non-compete” (não-competição) de Müssnich, que se encerrou em 1º de setembro, junto ao Carrefour, o que o liberou para voltar a esse mercado, ainda em período de forte concorrência entre as líderes Atacadão e Assaí.
O executivo ocupará a vaga aberta no colegiado em maio, após a renúncia de Luiz Nelson Guedes de Carvalho por motivos de saúde. Com a chegada do ex-CEO do Atacadão, o conselho volta a ter nove membros, sendo oito independentes. E Müssnich estará também em dois comitês, o financeiro e de investimentos e o de gente, cultura e remuneração, uma das área em que o executivo transita bem.
A chegada dele é carregada de recados ao mercado e simbolismos.
Müssnich vai atuar no conselho ao lado de Belmiro Gomes, também CEO do Assaí, e dá nova robustez a um colegiado sem grandes nomes do atacarejo — um negócio com poucos executivos disponíveis no mercado, já que a maioria são fundadores que estão em suas próprias companhias.
Essa era um questão que investidores traziam para a companhia nos últimos tempos. Gomes é, ao mesmo tempo, o CEO e aquele que mais entende da operação de atacado ali, e ao trazer Müssnich, esse peso se divide e o conhecimento de mercado ganha outra proporção, diz uma fonte.
Somados, ambos tem cerca de 35 anos de experiência na área. Além dos dois executivos, o conselho tem Enéas Pestana, ex-GPACotação de GPA, e com foco maior em varejo alimentar e na área financeira.
Gomes e Müssnich são antigos conhecidos e estiveram em campos apostos por pouco mais de dez anos, quando cada executivo liderava a sua empresa, com crescimentos acima de 20% ao ano.
Chegaram a trabalhar juntos no Atacadão numa época, e para muitos da área, travaram uma disputa por mercado (e por metros quadrados de lojas) de igual para igual, palmo a palmo, na última fase de ouro do atacarejo brasileiro.
A saída de Carvalho do conselho do Assaí abriu a vaga no colegiado e levou a uma aproximação maior entre Gomes e Müssnich, que já existia. “Pensam que eles são inimigos, ou não se falam, mas não tem nada disso. Cada um se respeita muito”, diz uma pessoa a par do assunto. Foi o próprio CEO do Assaí que sugeriu trazer Roberto — como é chamado no mercado — para a companhia, e as conversas ganharam peso a partir dali.
Com a entrada de Müssnich, o Assaí ainda reforça a linha de que não se trata de um “conselho do Belmiro”, com peças escolhidas pelo CEO.
É uma crítica que gestores faziam ao executivo depois que, em 2023, os franceses do Casino deixaram o controle e a governança passou por mudanças.
Após a saída do Casino, cerca de um ano e meio atrás, novos membros independentes entraram no colegiado, dentro da ideia de fortalecer a governança de uma “corporation”, que engatinha ainda nesse caminho de empresa de capital pulverizado, mas que busca mostrar ao mercado uma estrutura parruda e independente.
Agora, com Gomes e Müssnich lado a lado, será preciso ter como foco a geração de mais valor para a empresa, e criar um canal de comunicação e de troca entre ambos que funcione no conselho. Ambas são figuras carismáticas, com foco em pessoas e símbolos do atacarejo que deu certo. Mas, de lado a lado, com certa frequência viam, com reservas, decisões de gestão tomadas pelo rival quando disputavam mercado.
Inclusive, chegaram a concorrer entre si pelo controle de lojas, num “perde e ganha” de cada lado.
A chegada de Müssnich acontece num outro momento do atacarejo.
Atacadão e Assaí desaceleraram ritmo de crescimento e seguraram abertura de lojas após 2023. E cada um ficou com uma agenda própria para resolver questões internas.
No caso do Assaí, a alta alavancagem e a digestão das lojas adquiridas do Extra, algo que tem se resolvido, e no Atacadão, a integração com a rede Big e a necessidade de crescer mais rapidamente.
Com esses pontos sendo tratados, para 2025, pode ser aberta nova agenda no setor, mais focada em eficiência e rentabilidade, e é aí que o Assaí tem se pautado para o reforço do conselho.
Müssnich esteve mais de 20 anos ligado ao Atacadão, como conselheiro estratégico de 2001 a 2007, e depois como CEO de maio de 2007 a dezembro de 2021. Foi ele que atuou na reestruturação da empresa e na negociação da venda dos antigos sócios da rede para o Carrefour, em 2007.
A partir daí, foi escolhido para ser o presidente, e o negócio foi ganhando gigantismo, especialmente na última década.
Müssnich acabou ganhando um nível de autonomia a ponto de nunca ter sido incomodado pelos controladores franceses, acostumados a interferir nas operações locais.
Trata-se do segundo nome entrando no Assaí sendo oriundo do grupo Carrefour. No fim de 2023, Vitor Fagá deixou o comando do Sam’s Club, que no Brasil é operado pelo Carrefour, e em janeiro deste ano se tornou vice-presidente de finanças e de relações com investidores do Assaí, posição estratégica dentro da diretoria executiva. Fagá não cumpriu cláusula de não concorrência, por escolha do Carrefour.
O mandato de Müssnich, assim como o dos demais conselheiros, termina na assembleia geral ordinária de abril de 2025.