As vendas no varejo cresceram abaixo do consenso de mercado em abril, mas mostraram resiliência, graças ao impulso dado pelo bom momento do mercado de trabalho, alta da renda e estímulos fiscais. Para os próximos meses, economistas preveem desaceleração, em parte pelas chuvas no Rio Grande do Sul e pelas condições financeiras mais apertadas que o esperado há alguns meses.
O volume de vendas no varejo restrito teve alta de 0,9% em abril, ante março, na série com ajuste sazonal, segundo a Pesquisa Mensal do Comércio (PMC), divulgada na quinta-feira (13) pelo IBGE.
O resultado do varejo restrito veio menor que a mediana estimada pelo Valor Data, de alta de 1,5%.
Na comparação com abril de 2023, o avanço foi de 2,2%.
No varejo ampliado, que inclui as vendas de veículos e motos, partes e peças, material de construção e atacarejo, o volume de vendas caiu 1% na passagem entre março e abril. Analistas e consultorias esperavam alta de 0,3%.
Na comparação com abril de 2023, o volume de vendas do varejo ampliado subiu 4,9%.
O bom desempenho do varejo em abril é explicado pela força do consumo das famílias, diz Georgia Veloso, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre).
“O resultado bem disseminado ocorreu por causa de fatores positivos que vimos no fim de 2023 e no começo de 2024, como aumento da renda real, o mercado de trabalho aquecido e reajuste de salários acima da inflação”, afirma.
A receita nominal do varejo restrito acumulou alta de 0,3% em abril, ante março. Na comparação com abril de 2023, houve alta de 4,6%. Já no varejo ampliado, houve recuo de 0,9% em abril, ante março. Na comparação com abril de 2023, a alta foi de 6,9%.
As vendas do comércio avançaram em abril, ante março em cinco das oito atividades pesquisadas no varejo restrito.
Os destaques positivos foram em equipamentos e material para escritório, informática e comunicação (14,2%), móveis e eletrodomésticos (2,4%), combustíveis e lubrificantes (2,2%), hipermercados, supermercados, produtos alimentícios, bebidas e fumo (1,5%) e artigos farmacêuticos, médicos, ortopédicos e de perfumaria (0,6%).
Por outro lado, registraram queda livros, jornais, revistas e papelaria (-0,4%) e tecidos, vestuário e calçados (-0,7%). A atividade de outros artigos de uso pessoal e doméstico apresentou estabilidade.
No varejo ampliado houve alta de 1,6% em veículos, motos, partes e peças e de 1,9% no material de construção, em abril ante março.
O crescimento das vendas do varejo em abril devolveu a desaceleração do mês anterior, diz Bruno Martins, economista sênior do BTG Pactual. “Houve avanço importante em relação à estabilidade que vimos em março”, afirma.
Segundo Martins, a recuperação veio com tudo, com exceção da parte de alimentos. “Supermercado cresceu, mas abaixo do esperado, e o atacarejo veio fraco”, diz.
De acordo com Cristiano Santos, gerente da PMC, o atacarejo, que está dentro do varejo ampliado, norteou a queda de 1% no volume de vendas do varejo ampliado em abril ante março.
“Se o mercado de trabalho está apertado e os indicadores de renda atingindo níveis recordes, por que a receita real de uma atividade voltada para alimentação, o atacarejo, não está refletindo isso?”, questionou Luis Otávio Leal, economista-chefe da G5 Partners, em relatório enviado a clientes.
“A despeito da predominância de atividades com variação positiva no mês, a receita real do varejo ampliado caiu”, afirma. “A interpretação mais plausível para esse comportamento é que a atividade de atacado especializado em produtos alimentícios, que possui o terceiro maior peso no varejo ampliado, apresentou retração.”
O economista ressalta, contudo, que se trata de uma especulação, pois ainda não existe uma divulgação específica oficial do componente – que só passou a ser incluído na PMC no ano passado.
Rodolfo Margato, economista da XP, afirma que, apesar da queda do varejo ampliado em abril, o comércio ainda deve contribuir positivamente para o crescimento da atividade econômica neste ano.
A projeção da XP é que o PIB do comércio avançará 0,3% no segundo trimestre, em relação ao primeiro. Na comparação com o segundo trimestre de 2023, a projeção é de alta de 1,7%.
Martins, do BTG, mantém posição semelhante e prevê alta de 1,5% do comércio no PIB, ante alta de 3% no primeiro trimestre.
“Ainda há muita demanda, muita renda. Os dados do PIB no primeiro trimestre não indicaram despoupança das famílias, pelo contrário. Além disso, a renda está crescendo mais rápido que o consumo, então ainda há espaço para crescer”, afirma.
“Enquanto não houver desaceleração importante no mercado de trabalho, com risco de perda de empregos, a tendência é a demanda continuar forte.”
Rio Grande do Sul
Os efeitos das enchentes no Sul não apareceram nos dados de varejo de abril. Alguns economistas, contudo, preveem que eles levem a um cenário mais negativo nos próximos meses.
“Não esperamos que se mantenha a força [vista nos últimos meses], especialmente em maio, por causa do Rio Grande do Sul, que tem peso de 6% no varejo, de forma agregada”, diz Isabela Tavares, da Tendências.
“A expectativa que temos para maio é de desaceleração e queda. Além do Sul, temos ambiente de menos confiança do consumidor, pressão sobre o preço dos combustíveis e ligeira piora das condições financeiras, dado o ambiente de incertezas domésticas e mudança [dos rumos] de política monetária tanto aqui quanto nos EUA.”
A Tendências espera queda do varejo em maio, com possibilidade de recuperação no segundo semestre, a um ritmo menor do que o visto no início do ano.
Para 2024, a projeção da consultoria é de alta de 2,8% para o varejo restrito e de crescimento de 3,5% para o ampliado.
Veloso diz que as chuvas potencializaram efeitos inflacionários já existentes e podem impulsioná-los também em segmentos como móveis e eletrodomésticos