Pedido de vista da ministra Nancy Andrighi, da 3ª turma do STJ, suspendeu análise de caso no qual um restaurante pede indenização a shopping center, que permitiu a instalação de novo restaurante, do mesmo tipo, diretamente em frente ao seu espaço.
Após 43 dias, o restaurante acordou com a administração do empreendimento um tipo de “direito de preferência” que garantia ao restaurante, no prazo de 60 meses (cinco anos), a prerrogativa de ser consultado antes de o shopping autorizar a instalação de estabelecimentos concorrentes.
Contudo, doze anos após o término do acordo, a administração do shopping autorizou a instalação de um segundo restaurante de comida japonesa.
O primeiro restaurante reagiu e ajuizou ação para que a inauguração do novo restaurante fosse barrada ou, alternativamente, que o contrato fosse rescindido por culpa exclusiva do shopping, alegando perdas e danos.
Em 1ª instância, o pedido foi considerado improcedente, mas a decisão foi revertida pela 22ª câmara Cível do TJ/RJ, que condenou o shopping a indenizar o primeiro restaurante.
Defesa do Shopping
Segundo a defesa do shopping center, representada pelo advogado Carlos Mário da Silva Velloso Filho, da banca Advocacia Velloso, a reforma da sentença em 2ª instância prejudicou significativamente o planejamento de distribuição de lojas dentro do shopping.
Ele explicou que a decisão judicial deixou a determinação do montante devido para uma fase posterior de liquidação, onde somente uma perícia contábil poderia avaliar se o aumento no faturamento do primeiro restaurante, devido à chegada do novo concorrente, resultou efetivamente em maior lucratividade.
O advogado defendeu que esse procedimento constitui uma violação do art. 373, I, do CPC, que estabelece a obrigação do autor de provar o fato que fundamenta seu direito. Segundo ele, isso não foi cumprido no processo.
Adicionalmente, Velloso Filho destacou que é direito e dever do shopping estar atento às dinâmicas de mercado e aos hábitos dos consumidores, para assim reorganizar seu espaço de maneira eficaz e evitar prejuízos tanto para o empreendimento quanto para os lojistas.
Por fim, o advogado mencionou a alegação de violação do art. 114 do CC, criticando a expectativa do restaurante de ser consultado sob qualquer circunstância sobre mudanças na organização das lojas.
Ele enfatizou que qualquer monopólio deve ser interpretado de maneira restritiva, pois a ausência de concorrência pode levar ao aumento dos preços e à queda na qualidade dos serviços e produtos oferecidos.
Defesa do restaurante
Para a defesa do restaurante, representada pelo advogado Marcelo Leite da Silva Mazzola, do escritório Dannemann Siemsen, apesar da autonomia do shopping center, este não está acima das leis e deve respeitar os princípios do Direito. Sustentou que houve violação da boa-fé objetiva, como reconhecido pelo TJ/RJ.
O advogado argumentou que se discute, na ação, suposta conduta deliberada do shopping, que teria como objetivo “asfixiar” o estabelecimento já instalado, buscando sua expulsão através da colocação estratégica de um concorrente diretamente em frente ao seu espaço.
Esta ação é descrita como uma forma de concorrência predatória, que seria uma retaliação do shopping devido ao restaurante ter assinado um manifesto contra uma política considerada abusiva pelo empreendimento.
Além disso, a defesa enfatizou que, no momento da instalação do novo restaurante, existiam outros espaços disponíveis dentro do shopping que poderiam ter sido utilizados, evitando conflitos diretos e respeitando a coexistência harmônica dos lojistas.
Antes do pedido de vista feito pela ministra Nancy Andrighi, o ministro Villas Boas Cueva, relator do caso, posicionou-se a favor da predominância da autonomia da vontade nas relações contratuais entre lojistas e shopping centers.
Destacou que o contrato deve prevalecer nas relações empresariais, a menos que existam cláusulas que coloquem os locatários em uma situação de desvantagem excessiva.
O ministro argumentou que a cláusula que conferia um direito temporário de preferência ao restaurante não resultou em uma desvantagem desproporcional.
Pelo contrário, observou que a chegada do novo estabelecimento, na verdade, aumentou o fluxo de clientes no restaurante já existente.
Cueva ressaltou que o objetivo da organização das lojas (tenant mix) é atrair o máximo de consumidores possível, tornando inviável determinar se o aumento de movimento foi a causa direta para a alteração nos lucros do restaurante, uma vez que vários fatores podem influenciar esses resultados, incluindo a gestão do restaurante e a qualidade dos produtos oferecidos.
Ao final, o ministro votou por prover o recurso, reforçando que não se pode presumir que o contrato crie uma relação em que o restaurante se sinta “dono” do espaço comercial.
Também mencionou que a suposta preferência durou apenas 60 meses, e que isso não justifica a pretensão do restaurante de manter um “monopólio virtual” sobre o local.