A facilitação do acesso do investidor de varejo a diferentes tipos de investimento, sempre com os devidos cuidados, é debatida há algum tempo pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Com a publicação da Resolução 175, o regulador avançou ao liberar investimentos de até 100% no exterior para o varejo e permitir o acesso desse mesmo público aos Fundos de Investimentos em Direitos Creditórios (FIDCs). Mas há espaço para ir além: os Fundos de Investimentos em Participações (FIPs), hoje restritos aos investidores qualificados e profissionais, poderiam ser flexibilizados para todos. A CVM estuda essa possibilidade e, para a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), ela é uma progressão natural a ser adotada, que pode beneficiar investidores e mercado.
Limitar a oferta de produtos financeiros com base no valor financeiro do investidor não é mais justificável, dada a crescente necessidade de diversificação. O fortalecimento das práticas de “suitability” e a disseminação de informações são o caminho para a maior oferta de produtos para todos os tipos de cliente. Essa discussão atravessa fronteiras: além do Brasil, Reino Unido, Estados Unidos e Austrália também debatem como ampliar as alternativas para o varejo.
Na seara regulatória, já existem normas que podem ajudar na oferta de produtos mais sofisticados, como os FIPs. É o caso da possibilidade de limitação da responsabilidade do cotista prevista na Resolução CVM 175, que impede o investidor de perder mais do que investiu no caso de o fundo atingir patrimônio líquido negativo, e que poderia ser estendida para os FIPs.
Mas quais outras medidas poderiam ajudar a levar os FIPs com segurança para o varejo? A Anbima se debruçou sobre o tema e elaborou uma série de propostas que foram apresentadas à CVM.
O regime informacional desses fundos é uma delas. Os investidores de varejo precisam de informações claras e objetivas sobre os produtos que são ofertados, e não seria diferente com os FIPs. Por isso, foi sugerida a criação de uma lâmina específica para esse produto, com publicação no mínimo trimestral, que resuma suas principais características – prazos, destinação de recursos, taxas, retorno, classificação de risco, entre outras – de forma que o investidor tenha tudo o que precisa para a tomada de decisão.
A redução da complexidade do produto também fomentaria seu alcance. Uma das propostas da Anbima é a realização de apenas uma chamada de capital ao longo da vida do fundo ou eventual estrutura de investimento, devendo o montante total ser aportado no momento inicial da aplicação. Hoje, as chamadas são abertas à medida que o fundo encontra projetos para investir.
Outra questão é a limitação de valor para investir nos FIPs. A Assessoria de Análise Econômica e Gestão de Riscos da CVM, em estudo em 2021, levantou discussão sobre o assunto. O problema é que a medida traria complexidades operacionais para o mercado, que teria que fazer esse controle.
Como alternativa – e considerando que o suitability possibilita um monitoramento quanto a adequação dos investimentos às características e os objetivos do cliente -, a associação propõe que o investidor possa aplicar qualquer quantia, desde que assine um termo no qual declara ter ciência de que está fazendo um investimento de longo prazo e que o valor aportado não prejudica sua saúde financeira.
Permitir que o varejo acesse os FIPs trará benefícios e será um impulso para a indústria de fundos brasileira, que já é a 11ª maior do mundo, segundo dados da Anbima. Para os investidores, a flexibilização oferece uma nova oportunidade de diversificação, juntamente com a perspectiva de retornos potencialmente mais atrativos. Para os prestadores de serviços, abre novas possibilidades de captação de recursos com uma base mais ampla de investidores. E, para a economia do país, propicia a injeção de novos recursos destinados ao estímulo de setores específicos, promovendo o investimento de longo prazo.