Empresas de varejo e de setores como os de telefonia e aéreo estão se estruturando para buscar receita extra com campanhas publicitárias segmentadas, baseando-se nas informações e nos hábitos de compra de seus clientes. Magazine Luiza, Pague Menos, Azul e TIM estão nesse grupo.
A estratégia conhecida como “retail media”, ou mídia de varejo, começou com anúncios dentro do comércio on-line. Isso fez da Amazon a terceira maior plataforma de publicidade dos Estados Unidos, atrás apenas do Google e da Meta, dona do Facebook, Instagram e WhatsApp. Em 2023, 14,6% dos investimentos em publicidade on-line nos EUA foram direcionados à Amazon, segundo a consultoria eMarketer.
Os números desse mercado são robustos e estão crescendo. No quarto trimestre, a receita da Amazon com publicidade somou US$ 14,6 bilhões, alta de 27% em base anual. Na semana passada, a varejista Walmart reportou receita de US$ 3,4 bilhões com publicidade em 2023, avanço de 28% em base anual. A empresa também anunciou a aquisição da fabricante de smartTVs Vizio, por US$ 2,3 bilhões, de olho em um novo canal de mídia para anunciantes.
O segmento de “retail media” ainda tem a menor fatia dos investimentos em publicidade digital no mundo (13,4%), mas está crescendo rapidamente, diz uma pesquisa da GroupM, agência do grupo WPP. Em 2023, esse tipo de publicidade recebeu investimentos de US$ 119,4 bilhões no mundo, alta de 9,8% ante 2022. Deve alcançar US$ 129,3 bilhões neste ano.
Na América Latina, o avanço da categoria de “retail media” é mais acelerado com expansão de 49,7% em 2023 e projeção de avanço de 49,2% este ano. “A concorrência entre Mercado Livre, Amazon e Walmart na região elevará a receita de ‘retail media’ de menos de US$ 1 bilhão em 2023 para US$ 5,3 bilhões em 2028”, projeta a GroupM.
O Mercado Ads, plataforma de “retail media” do Mercado Livre, gerou receita de US$ 13,5 bilhões no quarto trimestre de 2023, alta de 71,1%, em moeda constante, informou a empresa.
No Brasil, empresas como Magazine Luiza, Pague Menos, Azul e TIM avançam em suas estratégias de “retail media”, de olho em uma fatia da verba de publicidade digital que somou R$ 12 bilhões, em 2023 – isso equivale a 26% dos R$ 38 bilhões investidos em anúncios on-line. A maior fatia (74%) foi direcionada ao Google e à Meta, segundo a eMarketer.
A estratégia de “retail media” está avançando além do modelo ‘onsite’, ou seja, de campanhas em canais próprios como marketplaces, lojas físicas e aplicativos. As ações de “offsite” envolvem campanhas supersegmentadas com os dados dos clientes, em plataformas de busca, redes sociais, serviços de streaming e outras mídias.
“O potencial do ‘retail media’ offsite está no fato de ter maior precisão e capacidade de mensuração de resultados de vendas e ações de marca”, diz Marcelo Tripoli, sócio e diretor-presidente da agência Zmes. Por exemplo, diz, “uma indústria lança um produto voltado para bebês recém-nascidos pode usar dados de compradores dessa categoria, captados por uma rede de farmácias, para impactar os consumidores corretos durante seu consumo de mídia diário, seja no Instagram ou assistindo ao noticiário dentro do Globoplay”..
Em janeiro, a Zmes criou uma unidade de negócios dedicada a estruturar operações de “retail media” para empresas de diversos setores, incluindo a operadora TIM e a rede de farmácias Pague Menos. Tripoli projeta uma receita de R$ 20 milhões neste ano somente com a divisão de “retail media”.
A TIM iniciou testes de campanhas publicitárias em plataformas externas (“offsite”) desde o início deste mês. A empresa já trabalha com ações de “retail media” desde 2020, quando a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) entrou em vigor. Atualmente, a operadora tem a permissão de 35 milhões de clientes para oferecer anúncios de parceiros como Netflix, Zé Delivery e C6 Bank, diz Leonardo Siqueira, diretor da TIM da área de monetização de dados.
A Azul oferece bônus de R$ 100 ao turista que chega a São Paulo para usar em lojas da cidade
“Os canais de comunicação próprios [aplicativo, portal e mensagens de texto] têm um acesso restrito a clientes cadastrados e logados com senha. Já em um ambiente aberto, pode haver páginas indevidas, então temos um respaldo de que a campanha das marcas parceiras alcança um cliente real, não um robô”, compara Siqueira.
A operadora conta com uma plataforma chamada TIM Insights para analisar perfis de audiência da base de dados de 60 milhões de clientes cadastrados, incluindo score de crédito, hábitos de recarga de clientes pré-pagos, média de gastos da conta, pacotes contratados, adimplência e geolocalização.
“Com esse arcabouço de consentimento do cliente e a plataforma de ‘insights’, posso entregar uma base bastante assertiva de audiência aos anunciantes, o que ganha ainda mais relevância com o fim do suporte aos cookies”, nota Siqueira. Ele se refere ao fim do suporte a cookies de terceiros no navegador Chrome, do Google, até o fim deste ano.
A TIM pretende brigar por uma fatia maior da publicidade digital on-line a partir de setembro, quando se lança no “retail media offsite”. “O mercado de publicidade digital ainda é bastante centrado num duopólio de plataformas [Google e Meta] e acredito que todo mundo está buscando um pouco desse espaço”, diz o executivo.
A Azul Linhas Aéreas iniciou sua estratégia com o programa “Boas-vindas Azul”, em outubro, oferecendo bônus em dinheiro em compras e serviços personalizados aos passageiros que desembarcam em seis aeroportos no país.
Ao descer em Guarulhos (SP), por exemplo, o viajante recebe uma mensagem no WhatsApp oferecendo promoções como um bônus de R$ 100 em uma churrascaria, uma loja de roupas ou em uma locadora de automóveis na cidade. Ao aceitar um bônus, o cliente da Azul tem seu contato direcionado ao anunciante parceiro, gerando receita para a companhia. “Buscamos oferecer uma experiência mais completa ao viajante, dando continuidade ao relacionamento com ele após o desembarque”, diz Cristina Yoshida, diretora do programa de fidelidade e de receitas auxiliares da Azul. Em breve, o programa chega aos aeroportos de Florianópolis, Goiânia e Vitória, informa Yoshida.
As promoções são feitas de acordo com os perfis de clientes do programa de fidelidade da Azul e selecionadas com a ajuda de inteligência artificial da empresa de tecnologia CRMBonus. A rede de restaurantes Outback usa a ferramenta de “retail media” pelo WhatsApp. “A lógica é melhorar a experiência do cliente na fila de espera, permitindo que ele aproveite descontos no shopping, enquanto o Outback passa a monetizar essa espera”, diz Arthur Blaj, diretor de marketing da CRMBonus.
A Pague Menos direciona sua estratégia de “retail media” para as vendas on-line e para as lojas físicas, onde painéis de LED começarão a exibir anúncios segmentados pelos perfis de clientes de suas 1.700 farmácias. “Trago mais relevância na comunicação [de produtos e marcas] ao cliente, com algo que faça sentido, e consigo medir se esse investimento da indústria faz sentido, ou não”, explica Carlos Lacerda, diretor do Pague Menos Ads. “Isso nos dá acesso a novas verbas de marketing da indústria”.
Além das vendas, as campanhas de “retail media” também são usados para fortalecer marcas e atrair novos anunciantes, observa Celia Goldstein, diretora do Magalu Ads. “O ‘retail media’ nasceu como propaganda em resultados de buscas [no varejo on-line], mas há um potencial de ganho de escala e de alcance de marcas que não necessariamente vendem dentro do Magalu, como um banco ou uma montadora, por exemplo”, diz a executiva que assumiu a divisão de “retail media” do Magalu há um mês, trazendo sua experiência na Amazon. Ela conta que o foco é integrar as operações do grupo, incluindo Netshoes e Kabum, e ampliar a carteira de anunciantes.