Investidores fizeram vista grossa para dados de inflação acima do consenso no Brasil e nos Estados Unidos e os mercados tiveram reação contida ontem. A leitura é que os dados não são suficientes para que o Federal Reserve (Fed, banco central americano), e consequentemente o Banco Central brasileiro, mudem o plano de voo.
A taxa da T-note de 2 anos caiu de 4,363% para 4,258%, e o rendimento da T-note de 10 anos de 4,034% para 3,969%. No Brasil, a taxa do Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2025 saiu de 10,14% para 10,115% e a do DI para janeiro de 2027 recuou de 9,905% para 9,845%. O dólar teve queda de 0,34%, a R$ 4,8746, e o Ibovespa caiu 0,15%, para 130.649 pontos, pressionado pela baixa de 11,78% das ações da MRV.
Amplamente esperados pelo mercado, dados de inflação do Brasil e dos EUA referentes a dezembro vieram levemente acima das expectativas, mas, na prática, tiveram impacto limitado no dia.
Para os analistas Ian Lyngen e Ben Jeffery, do BMO Capital Markets, a reação do mercado de Treasuries não só desafia os dados do CPI como também a retórica do Fed. A presidente do Fed de Cleveland, Loretta Mester, avaliou que o CPI mostra que o trabalho do Fed em reduzir a inflação à meta de 2% ainda não acabou e, por isso, “março ainda é muito cedo para começar os cortes de juros”.
O presidente do Fed de Richmond, Thomas Barkin, foi na mesma linha ao afirmar que ainda espera ser “convencido” de que a inflação está caminhando para 2%. Já Austan Goolsbee, de Chicago, repetiu seu tom suave ao afirmar que os cortes de juros devem vir se a inflação mantiver a tendência atual.
De qualquer forma, o mercado manteve a projeção de que os cortes começarão no primeiro trimestre para um total de seis reduções de 0,25 ponto percentual em 2024. “A probabilidade de que o Fed se mova ainda é de mais de 60%; uma dinâmica que implica muito mais indiferença em relação à trajetória atual e parece ser prospectiva em algum aspecto. O processo de determinação de qual aspecto considerar nos deixou sem saber o que fazer. É certo que essa não é a primeira vez que o mercado nos deixa confusos.”
Uma explicação possível para o mercado ter ignorado o CPI é o fato de que boa parte da alta em dezembro veio do setor de habitação. Este item pesa menos sobre o índice de preços de gastos com consumo (PCE, na sigla em inglês), medida de inflação preferida pelo Fed.
Mauricio Valadares, diretor de investimentos da Nau Capital, diz que a guinada “dovish” do Federal Reserve (Fed) no fim do ano passado deu força ao mercado porque tornou mais palpável a discussão de corte de juros. Mas entende que a reprecificação foi muito agressiva desde então, o que tirou a assimetria positiva dos ativos.