Os primeiros indicadores sobre o desempenho das vendas neste Natal sinalizam fim de ano decepcionante. Após Black Friday fraca – a segunda pior da história do setor – a Serasa Experian informou ontem que as vendas do varejo físico recuaram 1,4% em comparação com o mesmo período de 2022.
Com isso, a principal data do comércio volta ao terreno dos números negativos, reforçando a tese do “voo de galinha” nesse mercado, com altas que não se sustentam ao longo dos anos. É algo que, desde 2021, afeta os planos de retomada de investimentos no setor.
Os dias posteriores ao Natal têm sido animadores de três a quatro anos para cá e podem melhorar esse desempenho – há trocas de produtos e as liquidações, inclusive, já começaram – mas é pouco provável que isso seja capaz de inverter a curva negativa. Ontem, promoções nos shoppings de São Paulo variavam de 30% a 80%.
Em termos de variação, o recuo de 1,4% é o pior desempenho desde 2020, quando as vendas despencaram 10,3% (veja a tabela ao lado). Os dados correspondem ao período de 18 a 24 de dezembro.
Num intervalo mais curto, de 22 a 24 de dezembro, o recuo nas vendas foi mais relevante, de 10,7% sobre os dois dias anteriores ao Natal de 2022. Especificamente em São Paulo, houve diminuição de 1,2% nas vendas na semana do Natal, e de 9,6% de 22 a 24 de dezembro.
No material publicado pela Serasa, o economista-chefe Luiz Rabo afirma que a inadimplência continua em patamares elevados – apesar de ter cedido levemente em novembro – e a prioridade dos consumidores foi a reorganização dos orçamentos neste fim de ano. “[Consumidores] optaram por utilizar o 13º salário para pagamento e renegociação de dívidas”, afirma.
O fato de a véspera de Natal ter ocorrido num domingo, dia com demanda mais fraca nas lojas nos últimos anos, também pode ter influenciado no resultado, diz o economista. Somado a isso, ações promocionais pouco agressivas pelos lojistas, voltadas a recuperar margens, podem ter tido impacto, dizem consultores.
O dado da Serasa, inicialmente, parece contrastar com o cenário de demanda geral mais aquecida, segundo o indicador de consumo das famílias, divulgado nas pesquisas do PIB. Ocorre que, no relatório da Serasa, há um peso forte das vendas que dependem de crédito (como móveis e eletrônicos), que perdeu muita força com a alta dos juros após 2021. E essa demanda cresceu pouco também nas pesquisas sobre o comércio do IBGE. A alta nas vendas desses itens foi de apenas 1% de janeiro a outubro.
A metodologia da Serasa segue como base uma amostra das consultas realizadas pelos lojistas no banco de dados da empresa, no momento da venda. Compras em cartão de débito ou PIX não são termômetro nessa pesquisa. Cerca de seis mil estabelecimentos fazem consultas mensais ao Serasa.
Numa análise dos resultados na década, houve três momentos de taxas negativas no Natal: na maior recessão já enfrentada pelo país, em 2015 e 2016, no governo de Dilma Rousseff, quando as vendas caíram 6,4% e 4%, respectivamente; na pandemia, com a queda de 10,3%, e novamente em 2023.
Nas últimas semanas, varejistas buscavam criar ações específicas para as vendas natalinas, como as propagandas com “cash back”, para tentar mudar o ambiente após a Black Friday. Mas as estratégias focaram em vendas sem descontos em dezembro, com ganhos de rentabilidade, mesmo que isso levasse a um eventual efeito nas vendas.
“As campanhas de ‘cash back’ cresceram muito neste Natal, e o problema é que, para usar o dinheiro que volta, o cliente tem de gastar novamente. É algo de efeito limitado”, diz um consultor de marketplaces, que tem alertado os seus clientes desse fato.
Além disso, o consultor lembra que o varejo vem incentivando amplamente a venda com PIX para melhorar o seu caixa, e isso tem um impacto posterior. “Nos meses seguintes após pagar com o PIX, o cliente vai segurar os gastos”.
Ontem, a Alshop, que representa lojistas de shoppings, informou que consultas preliminares às lojas indicavam fluxo maior de clientes, mas dados de vendas fechados só devem ser publicados nos próximos dias. Outras empresas de pesquisa também devem apresentar levantamentos nesta semana.
“Nos contatos que tivemos, foi ressaltado aumento de fluxo e de número de presentes em relação a 2022, só que não há clareza se o tíquete médio subiu. Projetamos crescimento discreto neste ano, de 1,5% a 2%”, diz o diretor institucional da Alshop, Luiz Augusto Ildefonso. Caso isso se confirme, o varejo não deve recuperar da perda acumulada recente. Em 2021, o recuo nas vendas, segundo IBGE, foi de 2,9% em dezembro, e em 2022, a alta foi de 0,4% em volume sobre o ano anterior.