A oferta de debêntures da Enauta, concluída na última semana, gerou burburinho no mercado por um motivo específico: a parcela da oferta que ficou nas mãos dos bancos como comissão. Do R$ 1,1 bilhão captado com a operação, quase 24%, ou R$ 261,6 milhões, ficaram com as instituições que coordenaram a operação. Em outras ofertas recentes, como da empresa de energia Taesa, a comissão foi de 4,49%.
O caso da Enauta é parecido com o da companhia de saneamento Aegea, que captou em agosto R$ 5,5 bilhões em debêntures. A comissão dos bancos foi equivalente a 17,4% da operação, ou seja, R$ 964,4 milhões.
O caso da Enauta é parecido com o da empresa de saneamento Aegea, que captou em agosto R$ 5,5 bi
Segundo fontes ouvidas pelo Valor, as operações da Enauta e da Aegea tinham uma característica em comum que ajuda a explicar a comissão mais alta. Ambas foram combinadas em meio ao cenário de piora do mercado de crédito privado decorrente dos casos Americanas e Light, que provocaram resgates nos fundos de investimentos.
A oferta da Enauta começou a ser discutida ainda em 2022, quando o mercado estava em níveis mais saudáveis. O plano era levantar R$ 2,5 bilhões em uma tacada só, apurou o Valor. Os bancos que foram consultados, porém, descartaram essa possibilidade, prevendo dificuldades na absorção do volume pelo mercado.
A empresa então fechou uma operação mais restrita em dezembro, de R$ 1,4 bilhão. A coordenação foi do BTG Pactual. A Enauta deixou combinado com os bancos que voltaria ao mercado de debêntures para captar o volume restante, R$ 1,1 bilhão, agora em 2023.
As conversas sobre a nova oferta foram concluídas em março, quando as condições de preço estavam piores. “Os bancos deram garantia firme em um momento onde tudo estava pagando muita taxa”, diz uma fonte que pediu para não ser identificada. Na oferta mais recente da Enauta, atuaram XP (líder), ABC Brasil e BTG Pactual. Eles não comentam o caso.
O tamanho da necessidade de captação das duas companhias também influenciou na comissão maior. A Enauta precisava dos recursos para ampliar seu nível de produção de petróleo. A Aegea, para tocar projetos.
Para aumentar as chances das ofertas, os bancos costumam dar a chamada “garantia firme” que assegura que, se não houver demanda suficiente para as debêntures, as instituições financeiras ficam com os papéis – o que também é considerado no cálculo da comissão. Em emissões mais longas, como as de empresas de infraestrutura, também pesa o tempo maior que os papéis devem ficar na carteira das instituições.
No caso da Enauta, um terço da remuneração recebida pelos bancos veio da chamada “comissão do sucesso”, apurou o Valor. Essa comissão é cobrada quando há uma redução na taxa de juros que o emissor paga em comparação ao teto proposto no início da oferta. Dessa forma, a empresa concorda em dividir parte do benefício com quem cuida da operação. Na oferta da empresa de petróleo, a demanda chegou a 1,3 vez o livro de ofertas. Com isso, a taxa foi reduzida de 14,75% a cerca de 14% ao ano.
Na oferta, da Aegea, a “comissão de sucesso” foi equivalente a quase metade de toda a comissão paga. Inicialmente, o plano era pagar IPCA + 8,1% na primeira série dos papéis e IPCA + 9,2% na segunda série. Com a oferta chegando a quase o dobro do livro, a taxa ficou em IPCA +7%.
As críticas que surgiram após a oferta da Aegea não foram bem recebidos pelos bancos. “O mercado comenta, mas no momento de estresse do começo do ano eram poucos os que estavam dispostos a entrar nessas operações”, diz um executivo na condição de anonimato.
A Enauta disse em nota que “a remuneração aos bancos participantes da oferta de debêntures refletiu o êxito da operação diante de sua dimensão, complexidade e condições de mercado”. A companhia destacou que está em progresso acelerado de implementação da Fase 1 de Atlanta, realizando entregas positivas ao longo dos últimos meses, como a conclusão de todos os poços produtores e o inicio da campanha de instalação e ancoragem da nova plataforma de produção de petróleo. A Aegea não comentou.
Aegea não se manifestaram.